Primeiras notas sobre constitucionalismo e direito constitucional

Nossa incursão no estudo do direito constitucional supõe reflexão sobre a topografia do constitucionalismo como movimento político e histórico, estabelecido em torno da idéia de "organização" do Estado, bem como limitação do poder.

O direito constitucional, por sua vez, está imbricado pela articulação em torno das categorias "ciência", constitucionalismo e Constituição, situados num contexto sócio-político e dimensionados estruturalmente nos influxos que o mundo globalizado (hegemônico e contra-hegemônico) apresenta.

Daí a razão para buscar nos movimentos constitucionalistas pontos de apoio no desenvolvimento do constitucionalismo brasileiro, tendo em vista que a herança européia se manifestou na irradiação normativa das metrópoles para as antigas colônias.

Buscando movimentos históricos constitucionalistas, podemos situar a promulgação da Magna Carta(1215)http://www.constitution.org/eng/magnacar.htm na Inglaterra, lembrando que ela não se consolida como uma efetiva carta constitucional, mas, antes, uma carta feudal, elaborada com o fito de proteção dos privilégios do baronato e dos direitos dos homens livres em face do poder real (Albert Noble).

Séculos depois, a Petition of Right (1628) http://www.constitution.org/eng/petright.htm marca um documento solene, dirigido ao monarca pelos membros do então parlamento inglês, pleiteando o reconhecimento de direitos e liberdades extensíveis aos súditos – caráter de transação entre a monarquia e o Parlamento.

Habeas Corpus Act (1679) http://www.constitution.org/eng/habcorpa.htm reforça à idéia de liberdade, mormente individual, suprimindo as prisões arbitrárias de vossa Majestade. Chamo a atenção para o Bill of Rights (1688) http://www.tpuc.org/The_Declaration_of_Rights_1688/9 inglesa – resultado da Revolução gloriosa, na qual se firmou a supremacia do Parlamento, impondo a abdicação do Rei Jaime II, com a ascensão dos monarcas Guilherme III e Maria II, cujos poderes reais já se mostravam limitados.

Nessa carta sobreleva-se o caráter revolucionário de limitação dos poderes monárquicos, estabelecendo uma "monarquia constitucional", submetida à soberania popular representativa (Parlamento).

Dentro desse "passeio" constitucionalista, importante ressaltar a mudança de paradigma, por meio de modificação de exercício de poder (monarquia para Parlamento).

Porém, nos Estados Unidos da América do Norte, o movimento de constitucionalização seguiu os influxos revolucionários de questionamento do poder monárquico inglês, diferenciando-se do constitucionalismo europeu, em vista da peculiaridade da colônia.

A Declaração de Direitos do Bom Povo da Virgínia (1776)http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/dec1776.htm é anterior ao movimento de libertação das Treze Colônias na América mostrando preocupação com a estrutura de um governo democrático, bem como com um sistema de limitação de poderes diante crença na existência de direitos naturais e imprescritíveis do homem. A Declaração de Independência dos Estados Unidos (1787) http://www.embaixada-americana.org.br/index.php?action=materia&id=645&submenu=106&itemmenu=110 foi preliminarmente destituída da declaração de direitos fundamentais do homem, sendo exigência para a ratificação dos nove Estados necessários.

Como herança mais proeminente, a hermenêutica estadunidense marca o que se chama de compreensão material da Constituição, condensando o que seriam "consciência nacional e imperativos históricos" que marcam o percurso daquela nação, numa interpretação construtiva.

Na Europa, o constitucionalismo liberal consolidou-se a partir da revolução francesa em 1789, que representou uma vaga constitucionalista abstrata e universalizante, pautada no intelectualismo, no mundialismo, ao mesmo tempo em que prenunciava o individualismo, a liberdade e a igualdade em torno da idéia de fraternidade, por meio da substituição do foco do poder.

O movimento francês, contudo, difere muito do estadunidense, pela pecualiaridade em torno da idéia de relação com o Estado.A Declaração dos direitos do homem e do cidadão (1789) encontra-se disponível em http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html.

Essa é a síntese do constitucionalismo preambular que trouxe inspiração para movimentos congêneres. Antes de prosseguirmos com o caminho, contudo, interessante pontuar questões para reflexão:

  1. Onde o Brasil encontra-se situado neste contexto apresentado?
  2. Existem reflexos dos modelos políticos e econômicos adotados em torno das cartas constitucionais?
  3. Qual o papel e a relação entre Portugal, Inglaterra e Estados Unidos, bem como reflexos no Brasil?
As idéias centrais para nossas discussões:
  • juridicização do liberalismo.
  • dupla égide de entendimento: política, ligada à garantia do cidadão perante o Estado e econômica, ligada a uma economia de livre mercado.
  • fixação de segurança jurídica, em face dos despautérios da monarquia.
  • personalização do Estado, que passa a prestar condutas positivas.
  • elevação da propriedade como parâmetro.
  • supervalorização do individualismo e execração do socialismo lato senso.
Joaquim José Gomes Canotilho http://pt.wikipedia.org/wiki/Jos%C3%A9_Gomes_Canotilho entende existir uma relação dicotômica entre "idéia dogmática" de Constituição e "um pacto fundador", percebdondo na carta constitucional um esquema político de regras que definam um esquema de atividade e uma justa configuração das instituições sociais, de forma a permitir aos homens a organização e funcionamento de uma sociedade bem ordenada.

A criação de um pacto fundador procura-se em estruturas simbólicas, arquetípicas, em uma verdadeira narrativa mitopoiética. Dentro disso, a Constituição aproxima-se de um "jogo", ou seja, espaço de jogo aberto à criatividade prática e estratégia dos jogadores, havendo regras convencionais, reguladoras e institucionalizadoras, bem como o espaço de indeterminação, que permite a inventividade, a criatividade.

Bibliografia:

BARROSO, Luís Roberto Barroso. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo – Os conceitos Fundamentais e a Construção do Novo Modelo. Saraiva. 2010.


BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros. 2010.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7.ed.

Coimbra: Almedina, 2010.