segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

PM faz louvor à violência e usa o termo morte em confronto para justificar execuções sumárias

Acho interessante postar notícias para polemizar o debate. A fonte do texto é O POPULAR, para quem quiser acessar outras referências. Daí sempre volto à discussão sobre a "bala perdida" (que entendo ser bala desviada, mas nunca perdida, porque, num confronto, a desídia em face do coletivo é geral), o tiro de advertência, entre outros.


PM faz louvor à violência e usa o termo morte em confronto para justificar execuções sumárias

Na Polícia Militar (PM) não são incomuns os elogios formais a policiais que matam em ocorrências - nem mesmo naqueles casos em que a morte se dá em circunstâncias obscuras, de difícil apuração de responsabilidades. A Operação Sexto Mandamento da Polícia Federal, que prendeu 19 militares acusados de integrar grupos de extermínio em atuação há mais de dez anos em Goiás, revelou que a alegação "morte em confronto", tão utilizada em relatórios da PM, se tornou um eficiente artifício para justificar execuções sumárias durante ação policial.

Toda ocorrência com morte resulta numa sindicância, procedimento interno para apurar se houve crime ou se o policial agiu em legítima defesa. O louvor à violência, presente em algumas sindicâncias, dificulta ainda mais o trabalho de apuração de responsabilidades e reproduz uma cultura que muitas vezes beneficia o policial truculento, em detrimento daquele que utiliza expediente de uso gradual da força, segundo a necessidade. Na semana passada, O POPULAR revelou que 50 pessoas foram mortas em supostos confrontos com a polícia no ano passado em Goiânia. Quase o dobro de 2009, quando 27 pessoas morreram nas mesmas circunstâncias.

A reportagem teve acesso a sindicâncias que enaltecem e indicam promoções a policiais envolvidos em ocorrências com mortes, muitas vezes desprovidas de provas suficientes para sequer inocentar esses policiais. Primeiro de maio de 2008, fim da manhã. Depois de passar a noite bebendo numa festa em Brazlândia, cidade -satélite de Brasília, o estudante da Marinha do Brasil Agenor de Sales Souza, de 23 anos, passou em casa para trocar de roupa. Ele havia conhecido dois rapazes na festa, que o convenceram a participar de uma aventura: assaltar um restaurante em Formosa, a 272 quilômetros de Goiânia. "O Agenor estava errado, estava bêbado e deixou-se levar por esses rapazes. Mas era um meninocomum, um marinheiro, sem passagem pela polícia, nunca se envolveu em crime", disse um parente de Agenor, que pediu anonimato.

Agenor e mais dois rapazes chegaram ao restaurante na divisa de Goiás com o Distrito Federal pouco depois das 10 horas da manhã. Agenor e Hudson Roberto de Lima, então com 19 anos, entraram no local e anunciaram o assalto. Enquanto recolhiam pertences de clientes e do caixa, uma equipe da PM se aproximou. O terceiro integrante do grupo, que havia ficado no carro, os abandonou. Agenor e Hudson roubaram o automóvel de um cliente para a fuga. Houve perseguição, inicialmente, por um veículo da PM. À frente, próximo a Planaltina, mais dois carros do Grupo de Patrulhamento Tático (GPT) entraram em ação.

Os rapazes foram interceptados na saída da GO-430. Agenor foi atingido por um tiro de fuzil na cabeça. O laudo cadavérico aponta uma fratura exposta no dedo polegar esquerdo e amputação da área acima da orelha esquerda, com lesão encefálica, proveniente de "tiro a curta distância" (50 centímetros no máximo). "Todos os legistas e policiais com quem conversei disseram que isso é característico de execução. O Agenor deve ter descido do carro se entregando", diz o familiar. Hudson também levou um tiro de fuzil na cabeça, além de outro no tórax, mas sobreviveu e cumpre pena em Brasília. Um dos policiais teria sido atingido por um tiro de raspão no braço.

Na sindicância que apurou o caso, realizada pelo 16º Batalhão da PM em Formosa, consta que "não houve cometimento de crime por parte dos policiais militares, que não cometeram excessos em suas ações". O texto os classifica como "audaciosos e destemidos", diz que a ação foi um sucesso e que a eficiência teve repercussão positiva em toda região (de Formosa), "com matéria veiculada na mídia local, inclusive moção de congratulação expedida pela Câmara Municipal de Formosa". Mais à frente, o sindicante (policial que assina o texto), diz que "vislumbra ação meritória praticada pelos bravos policiais, que desencadearam ação com excelente resultado e exemplo positivo", que a ação "merece destaque pelo profissionalismo" e encaminha os autos à Comissão de Promoções e Medalhas.

O comandante do 16º Batalhão à época, o então major Ricardo Rocha Batista - apontado pela Polícia Federal como um dos líderes do suposto grupo de extermínio em ação dentro da PM de Goiás - remeteu a sindicância à Corregedoria da PM e à Comissão de Promoções. Os policiais foram promovidos e até hoje não foram julgados pelo caso.

Sindicância destaca ação 'digna de louvor'

Na noite de 11 de novembro de 2009, o 24º Batalhão da Polícia Militar recebeu ligação informando que Marcelo Ferreira dos Santos, de 30 anos, ameaçava com uma pistola um colega de copo num bar em Barbosilândia, distrito de Posse. Uma equipe do Grupo de Patrulhamento Tático entrou em ação e quando chegou ao local o bar já estava fechado. O veículo então iniciou patrulhamento pela região quando teria se deparado com Marcelo que, segundo a sindicância, estava com a pistola em punho. A apuração da PM diz que o carro parou a 10 metros "do meliante", exigiu que Marcelo largasse a arma, mas "ele não atendeu e, apontando-a aos policiais, disparou um tiro que felizmente não atingiu ninguém". Marcelo levou dois tiros, um em cada peito.

Não há testemunhas do caso e as armas utilizadas para matar Marcelo nãoforam recolhidas para confecção de laudos. "Os militares, de maneira lícita, reagiram à injusta agressão", diz a sindicância, que destacou legítima defesa e indicou os nomes dos policiais envolvidos à Comissão de Promoções e Medalhas, em vista "de um trabalho digno de louvor". O Ministério Público ofereceu denúncia por entender que as provas não são suficientes para determinar a "ilicitude da atividade dos policiais".



Fonte: O Popular

Pena alternativa e regime inicial aberto para casos de tráfico

Estou postando aqui uma decisão bem importante do Superior Tribunal de Justiça (STJ) hoje. Espero que gostem!

DECISÃO
É possível pena alternativa e regime inicial aberto para casos de tráfico
É possível a substituição da pena privativa de liberdade por medidas restritivas de direitos, bem como o estabelecimento de regime diverso do fechado, em condenações por tráfico de drogas. A decisão é da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reafirmou tanto a sua jurisprudência quanto a do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema.

A apenada foi presa em flagrante ao tentar levar, na vagina, 58 gramas de cocaína a detento na Penitenciária de São Sebastião (DF). A pena foi fixada em um ano e onze meses de reclusão, mais multa, a ser cumprida em regime inicial fechado. Para o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), a Lei n. 11.343/2006 (Lei de Tóxicos) impediria o benefício. A mesma norma também inviabilizaria a substituição da pena por medida restritiva de direitos.

Mas, segundo o ministro Og Fernandes, a referida legislação não é harmônica com os princípios da proporcionalidade. “A imposição do regime fechado, inclusive a condenados a penas ínfimas, primários e de bons antecedentes, entra em rota de colisão com a Constituição e com a evolução do Direito Penal”, asseverou.

Nas instâncias ordinárias, a pena da condenada foi fixada no mínimo legal, de cinco anos de reclusão, e a minorante do artigo 33, parágrafo 4º, da Lei 11.343/06 – aplicada a agente primário, portador de bons antecedentes, que não integre organização criminosa nem se dedique a tais fins – foi estabelecida no patamar máximo. Por isso, apesar da disposição da lei, o regime inicial aberto seria perfeitamente aplicável, diante do princípio da individualização da pena.

Ressaltou-se, ainda, que a pena pode ser substituída por prestação de serviços e limitação de fim de semana. Tal entendimento já é aplicado pela Sexta Turma há pelo menos um ano e está alinhado com o ponto de vista do STF sobre o tema.

O ministro citou decisão do Supremo (HC 97.256/RS), relatada pelo ministro Carlos Ayres Britto, na qual o tribunal declara, de forma incidental, a inconstitucionalidade dos dispositivos da Lei de Tóxicos que vedam a conversão da pena em medida alternativa.

Considerando a pena aplicada – 1 ano, 11 meses e 9 dias de reclusão em regime aberto –, bem como a primariedade e inexistência de circunstâncias judiciais desfavoráveis à substituição [de pena], é medida que se impõe”, concluiu o relator.

domingo, 27 de fevereiro de 2011

Competência para julgamento do homicídio no caso de genocídio

Pessoal, oi!

Estou postando a referência mencionada em sala sobre a competência para o julgamento do homicídio quando praticado no caso de genocídio. Posto o texto e, depois, o link do aresto do STF, no bojo do RE 351487, de Roraima.

Conversamos na sala a respeito da competência, tendo em vista existir conflito entre duas disposições da CF/88: uma, relacionada ao julgamento de crimes dolosos contra a vida (Júri) e outra, relacionada aos que estão numa seara de ataque a direitos coletivos, de caráter transindividual.

Comentamos no blog sobre o julgamento em esfera FEDERAL, afeto a um tribunal do júri. Ou seja, Tribunal do Júri federal, como forma de compor os artigos, pois o homicídio praticado por ocasião de genocídio diz respeito a ataque de bens jurídicos que estão afetos à esfera da justiça federal.

Vou negritar a referência;

"(...) EMENTAS: 1. CRIME. Genocídio. Definição legal. Bem jurídico protegido. Tutela penal da existência do grupo racial, étnico, nacional ou religioso, a que pertence a pessoa ou pessoas imediatamente lesionadas. Delito de caráter coletivo ou transindividual. Crime contra a diversidade humana como tal. Consumação mediante ações que, lesivas à vida, integridade física, liberdade de locomoção e a outros bens jurídicos individuais, constituem modalidade executórias. Inteligência do art. 1º da Lei nº 2.889/56, e do art. 2º da Convenção contra o Genocídio, ratificada pelo Decreto nº 30.822/52. O tipo penal do delito de genocídio protege, em todas as suas modalidades, bem jurídico coletivo ou transindividual, figurado na existência do grupo racial, étnico ou religioso, a qual é posta em risco por ações que podem também ser ofensivas a bens jurídicos individuais, como o direito à vida, a integridade física ou mental, a liberdade de locomoção etc.. 2. CONCURSO DE CRIMES. Genocídio. Crime unitário. Delito praticado mediante execução de doze homicídios como crime continuado. Concurso aparente de normas. Não caracterização. Caso de concurso formal. Penas cumulativas. Ações criminosas resultantes de desígnios autônomos. Submissão teórica ao art. 70, caput, segunda parte, do Código Penal. Condenação dos réus apenas pelo delito de genocídio. Recurso exclusivo da defesa. Impossibilidade de reformatio in peius. Não podem os réus, que cometeram, em concurso formal, na execução do delito de genocídio, doze homicídios, receber a pena destes além da pena daquele, no âmbito de recurso exclusivo da defesa. 3. COMPETÊNCIA CRIMINAL. Ação penal. Conexão. Concurso formal entre genocídio e homicídios dolosos agravados. Feito da competência da Justiça Federal. Julgamento cometido, em tese, ao tribunal do júri. Inteligência do art. 5º, XXXVIII, da CF, e art. 78, I, cc. art. 74, § 1º, do Código de Processo Penal. Condenação exclusiva pelo delito de genocídio, no juízo federal monocrático. Recurso exclusivo da defesa. Improvimento. Compete ao tribunal do júri da Justiça Federal julgar os delitos de genocídio e de homicídio ou homicídios dolosos que constituíram modalidade de sua execução."

HC 82.959-7 do STF

Nossa, não estaria esse post atrasado no tempo e no espaço? Afinal, o julgamento foi em 2006, tivemos modificação na lei em 2007. Sim, sim!

Mas achei legal postar no grupo o acórdão, disponível em http://redir.stf.jus.br/paginador/paginador.jsp?docTP=AC&docID=79206.

Para quem tiver paciência, é uma aula de direito constitucional...

Vale a pena!

Inté!

Quando os desalentos da vida nos transformam em funcionalistas

Estou em plena crise, uma anunciada crise que se estabeleceu ainda quando estava nos bancos acadêmicos...A crise do finalismo e o enamoramento com o funcionalismo, o tão temido "direito penal das máquinas"?

Do "não alinhado" (existem autores que, não sabendo alemão, muito menos espanhol, traduzem para inimigo - por razões óbvias, para descer a lenha - mas prefiro 'não alinhado', pois soa mais afim com a proposta de fidelização e lealdade à normatividade)... Aliás, não estou sozinha não - hehehe - o próprio Jakobs fez a advertência em "notinha de rodapé". Huahuahua

Hehehe, acontece que estou deixando para trás a percepção do humano, e vindo para a percepção de um mundo autômato, onde o "bem querer" e o "bem cuidar" cedem espaço para os "desculpa", "foi mal" e demais reforços retóricos que não trazem a internação da responsabilidade, muito menos a predisposição de zelo. Mas hei de reconhecer que os alemães têm uma percepção de grupo diferenciada, calcada na expressão de coletividade, nacionalismo, onde o zelo com o todo é bem hegelianamente óbvio, o bastante para sustentar o funcionalismo.

De máquinas a máquinas...

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Ministro do STF defere liminar para o juiz de Sete Lagoas voltar a falar em religião na 11.340/06

Acabei de postar um curso, módilo, oficina, sei-lá-o-quê sobre a Lei Maria da Penha, aboradando um assunto sério, de natureza constituciional, e me deparo com essa bomba aqui... Tenho vontade de postar a sentença do juiz, mas, em virtude da decisão do CNJ, não o farei.

Deveria, para evidenciar a todos o quão entranhada de religiosidade e preconceito de gênero está a malfadada sentença, falando que "o mundo é masculino e assim deve ser", que a culpa dos males é da mulher...enfim, de A a Z um tratado de atrocidades.

Não me posiciono de um lugar de fala ateu, agnóstico ou congênere. Apenas penso que os assuntos dessa natureza não podem ou devem ser trazidos como sustentáculo para decisões judiciais, tendo em vista que ferem a liberdade religiosa, já que a sentença prestigia um credo (ou dois, talvez três).

Vivemos eu um Estado plúrimo, de etnias diversas, que deram origem a percepções religiosas distintas, de tal sorte que, ao elencar uma, o douto magistrado simplesmente deixa vir à tona sua representação marcada de etnocentrismo.

Os indivíduos têm o direito a um acesso a uma Justiça que não faça distinção de credo, a começar, praticando, ela mesma, por meio dos seus órgãos, esse respeito. O Ministro Marco Aurélio, como órgão do colegiado supremo, ou seja, fazendo parte do Judiciário, igualmente poderia bem observar isso...

Afinal, está tão claro, no preâmbulo, que Deus, na CF/88, não está contido nas linhas. Mas, ao que parece, nas entrelinhas, sendo "aproveitado" nos discursos jurídicos (na verdade, a sentença, para mim, é uma RETÓRICA DE A A Z, vazia semanticamente e repleta de sofismas)

O Douto Juiz está de volta para cometer mais atrocidades com a lei Maria da Penha...

Eis a notícia...

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), deferiu medida cautelar em Mandado de Segurança (MS 30320) para suspender ato do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que afastou por dois anos o juiz Edilson Rodrigues. O afastamento foi determinado em procedimento administrativo disciplinar em que o juiz era citado por ter feito considerações contrárias à Lei Maria da Penha e às mulheres. Para o ministro, a providência de afastar o juiz foi inadequada “porque as considerações tecidas o foram de forma abstrata, sem individualizar-se este ou aquele cidadão”.

"É possível que não se concorde com premissas da decisão proferida, com enfoques na seara das ideias, mas isso não se resolve afastando o magistrado dos predicados próprios à atuação como ocorre com a disponibilidade", afirmou.

O “excesso de linguagem” foi apontado em sentença prolatada em 2007 em processo que envolvia violência contra a mulher, quando o juiz era titular da 1ª Vara Criminal e Juizado da Infância e Juventude de Sete Lagoas (MG). Em junho daquele ano, a Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais formalizou representação junto à Corregedoria do Tribunal de Justiça estadual e ao CNJ, solicitando providências quanto às “declarações de cunho preconceituoso e discriminatório”.

A representação foi arquivada pela Corregedoria do TJ-MG, mas, no CNJ, converteu-se em procedimento de controle disciplinar que resultou na imposição da pena de disponibilidade compulsória, por considerar a conduta discriminatória “análoga à do crime de racismo”. Para o ministro Marco Aurélio, “entre o excesso de linguagem e a postura que vise inibi-lo, há de ficar-se com o primeiro, pois existem meios adequados à correção, inclusive, se necessário, mediante a riscadura – artigo 15 do Código de Processo Civil”.

Em seu despacho, o ministro observa que o autor de atos contra a honra de terceiros responde civil e penalmente, conforme previsto no artigo 5º, inciso X da Constituição Federal. “Agora, se o entendimento for o de que o juiz já não detém condições intelectuais e psicológicas para continuar na atividade judicante, a solução, sempre a pressupor laudo técnico, é outra que não a punição”, afirma. No caso, a manifestação do juiz é, para o relator, “concepção individual que, não merecendo endosso, longe fica de gerar punição”.

O despacho do ministro Marco Aurélio suspende a eficácia da decisão do CNJ até o julgamento final do Mandado de Segurança, e garante ao juiz o retorno, caso afastado, à titularidade do Juízo no qual atuava.

fonte: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=172727&tip=UN

Oficina da Lei 11.340/06

Confirmadíssima a data, dia 25 de março, com tempo bastante para que possamos programas nossas agendas para uma oficina sobre a Lei Maria da Penha, que abordará as questões principais sobre a constitucionalidade (acreditam que AINDA existe essa discussão), dialogando com as categorias de gênero e violência doméstica.

Inté!

Depois postarei o local. Huahuahua...

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Personalidade voltada para o crime: nem Freud explica a omnisciência dos operadores do direito

Um post legal sobre a célebre frase "personalidade voltada para o crime", presente em boa parte das sentenças condenatórias de nossos Tribunais, bem como no discurso de alguns e algumas magistrados e magistradas do Tribunal de Justiça do DF.

http://www.arcos.org.br/periodicos/revista-dos-estudantes-de-direito-da-unb/7a-edicao/o-insustentavel-quandro-de-apreciacao-da-personalidade-do-agente-na-pratica-penal-brasileira/

Hehehe. Depois comentarei.

DIREITO PENAL 2 - REGIMES

Oi, pessoal, estou postando mais roteiro. Provavelmente iremos cumprir a parte inicial hoje e, na sexta, entraremos nos regimes.

O texto está disponível em http://www.4shared.com/document/IiHPY2kL/UNIDADE_2PENA_PRIVATIVA_DE_LIB.html

Até mais!

Sobre o estelionato emocional e outros ensaios...

Tod@s já conhecem, ao menos por alto, a figura do estelionato, descrita no art. 171 do Código Penal Brasileiro, de acordo com a seguinte redação: "Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento". Trata-se de uma lesividade direcionada ao patrimônio (dada sua posição dentro da sistematização do CPB, blá, blá, blá).

É tido como um crime de astúcia (como se a mente humana assim não fosse, ou, ainda, nossos atos, genericamente considerados dentro de uma escala de evolução de primatasa também não. Mas, enfim) ou seja, que não verte sangue, perfazendo-se por meio da dissumulação, do ardil, do embuste, com a finalidade de auferição de benefício que, segundo a doutrina, tem conteúdo ou expressão patrimonial ou dimensão econômica.

Quando o assunto diz respeito ao direcionamento da atividade lesiva para tal estutura de dano de dimensão patrimonial e auferição de vantagem econômica, ninguém tem dúvida sobre momento consumativo, estrutura típica etc. - aquela mesma conversa que recheia os livros de doutrina, os corredores de faculdades e a hora do chá nos tribunais. É a expressão máxima do direito patrimonialista, que sempre esteve às voltas em situar o patrimônio andando "casadim" com a vida (basta ver o índice sistemático do CPB e enxergar isso).

O que está me ocupando, por agora, é saber como o direito penal (sim, esse que ainda insistimos em "sacar" do coldre para quixotescamente lançar, como dados, na "luta", "resolução", no "combate" à criminalidade [coloquei entre aspas por achar um absurdo ainda insistirmos nesses verbetes: "luta" e "combate", como se estivéssemos em guerra; "resolução" como se a decisão judicial, a execução da pena de demais consectários trouxesse a satisfação plena dos envolvidos] enfrenterá uma tipologia de criminalidade que envolve a astúcia como manobra ou meio de consecução para a chamada (e não tipificada) "violência psicológica" prevista no art. 7o. da Lei 11.340, a Lei Maria da Penha.

Segundo a redação inovadora, entende-se por violência psicológica contra a mulher toda "conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação" - uma estrutura de comportamento que visa o chamado DESEMPODERAMENTO da mulher e que, na empiria, ou seja, na "real" da nossa vida, reflete um comportamento que simplesmente esvoassa, como ar, de tão arraigado na prática diuturna da sociedade brasileira, presente em todos, TODOS os nichos sociais, de A a Z.

Trata-se de um tipo de tutela que toma como pressuposto o estado de vulnerabilização em que a relação se transmudou, que pode tanto ser estrutural (ou seja, a sistemática da relação, desde sempre, se fez assim, na assimetria) ou conjuntural, verificada em termos de processos que foram paulatinamente se perfazendo, depois de um evento ou outro processo.

Seja vulnerabilização estrutural ou não, o que está claro, na lei, é a resposta diante do verbete "violência psicológica", com condutas que, grosso modo, estão presentes como prius ou antecedente lógico de uma conduta que extravaze a agressão à psiquê e aponte para a ofensividade visível no corpo e na mente (refiro-me à modalidade de lesão corporal tipificada no CPB).

O que está claro para mim é a ausência completa de tipificação e, quiçá, de preocupação em lidar, em termos penais, com o ataque psicológico contra a mulher em situação de violência, pois todas as condutas acima - todas, sem exceção - não trazem verbete algum em termos de tipificação penal.

A consternação reside na constatação de que, no caso de violência doméstica, a agressão, via de regra, começa lá atrás, exata e pontualmente na dinâmica do ciclo de violência onde o físico e o mental (no sentido de neurológico, e não comportamental) são finalmente atingidos depois do psicológico ter sido deteriorado há tempos. Disso não se ocupa a tutela penal, ainda que a lei traga uma inovação em termos de detalhamento de violência.

Ou seja, o ataque à mente não interessa ao direito penal, ao sistema penal, enfim, à tutela, mas, paradoxalmente, a estrutura do sistema, como um todo, lastreia-se na lógica foucaultiana de mudança do suplício corporal (tortura) para a dizimação mental (desumanização por via de docilização de mente e corpo, o panóptico de Bentham). É uma MA RA VI LHA a hipocrisia na política criminal, penso!

Bom, esse assunto de intervenção penal deixo para outro post...

O que está me trazendo deleite é me debruçar sobre a figura do "estelionato emocional", uma modalidade ainda não típica - mas que causa danos, morte, dor, sofrimento.

"Delito" (piadinha, nem é típica a figura) praticado pelo uso da potencialidade discursiva, mental, onde o algoz ou a algoz, quase sempre vestid@ de capa de bom moço ou moça, erudit@, sedutor@, engendra formas de submeter a vítima aos seus propósitos, no intuito de se locupletar emocionalmente de uma história de "amor" cujos dividendos apenas se direcionam ao "bom mocinho" ou "à princesinha".

O sujeito ativo, ou seja, o/a ofensor, pode ser tanto um homem quanto uma mulher, mas, por motivos de pura epifania e deleite, hoje irei falar do estelionato emocional praticado no âmbito da violência de gênero e doméstica, por reconhecer que, historicamente situada, essa foi e tem sido a mais constante modalidade de agressão, em face da obviedade da tradição de sodomia emocional do feminino.

Não estou falando nada que historicamente não esteja evidenciado... Holocausto de mulheres. Femicídio. Discriminação. Seres sem alma para Platão, alijadas politicamente na pólis, bruxas, putas e outras alcunhas...

O que me interessa, por agora, é articular a dogmática na violência doméstica com a dimensão emocional, ou, dialogando com o Professor Luís Roberto Cardoso, o "insulto moral" que cerca a sutileza da agressão psicológica, ainda não convertida em delito. Ou seja, o estratagema voltado para a usurpação ou ataque psicológico, de proporções emocionais, que traz como resultado seu desempoderamento (ou, como preferirem, perda de autonomia): o chamado "estelionato emocional", presente em inúmeros casos de violência doméstica, que demanda cuidado e, infelizmente, ainda não está previsto em lei, não obstante a Lei Maria da Penha fazer menção direta a essa modalidade de violência.

No estelionato emocional, o alvo é a integridade psicológica da vítima, que é atacada, pouco a pouco, por meio de um processo de esfacelamento e desintegração da sanidade. Quem já não ouviu de um canalha desses o clássico "você está louca?" após serem descobertos em alguma falha no plano "perfeito" de desestabilização da ofendida?

Isso é um continuum, ou seja, uma conduta que se elonga temporalmente, lembrando-nos que também precisamos refletir a respeito de sua articulação com o art. 4o. do CPB, pois, afinal, o crime se deflagra no tempo da ação ou da omissão. O que dizer de uma conduta elongada, dessa natureza? Unidade de desígnio? Crime continuado? Hehehe...

O ciclo de violência começa com o ataque à mulher enquanto ser pensante e atuante politicamente: o estelionatário aprecia o lado "meiguinho", doce e sereno da "amada", não suportando as reações da vítima diante das manobras fraudulentas.

O ofensor toma isso como ato de agressividade quando, a bem da verdade, trata-se de ato de legítima defesa diante do ataque sofrido. Daí o ardil tomar outra forma: a de extirpação, ódio e violência recalcadas em mais e mais demonstrações de manipulação, outra face dessa sui generis modalidade de violência.

O estelionatário tem sempre o dom da palavra (por isso o trocadilho com o 171), pois precisa cativar a vítima e, diante disso, necessita formatar o discurso de acordo com a situação. Envolvimento.

Eis a dinâmica do estelionatário emocional, pois o ofensor capta a fragilidade e, dentro dela, nada de braçada, escaneando os pontos que poderá explorar, quando tecer suas teias de histórias inverossímeis, numa dimensão simbólica da violência tida como sutil (para alguns operadores do direito, "nem tão imoprtante assim"), mas que, diluída em doses homeopáticas, cega, fere e pode até matar.

A sujeição passiva? Mulheres empoderadas, dado o ódio feroz nutrido pelo feminino. Aliás, apenas para suscitar polêmica, penso que o estelionatário emocional odeia o feminino e faz questão de submetê-lo ao seu jugo, pelo simples deleite de integralizar alguma perversão que internamente nutre em relação ao suplício cometido.

Assunto para mais outro post, pois, neste, contento-me em expor o completo FRACASSO DA DOGMÁTICA PENAL, d@s legislador@s na criminalização primária, d@s operador@s do direito, enfim, em lidar com isso. Lidar com o ataque ao que é mais importante: os domínios da mente...

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Violência de gênero em plena DELEGACIA

Bom, não vou postar o vídeo porque não concordo com a exposição da policial, já que ela pediu para não filmarem a cena ULTRAJANTE, ABJETA, ABUSIVA e digna de nossa herança mais neanderthal.

Ela foi instada a tirar a roupa para uma revista e argumentou que não iria fazê-lo diante de homens.

A autoridade policial, em uma manifesta atitude patriarcalista, machista, misógina e autoritária, disse-lhe que "na ausência de mulheres" ele iria ver a revista. E, dentro dessa truculência, assim foi...

O resultado foi um vídeo que me causou espécie, sob todas as perspectivas e dimensões de violência possíveis em face do gênero, tendo em vista a maneira assimétrica em relação a qual os agentes se posicionaram para simplesmente arrancarem as calças da policial.

Acuada, quase currada moralmente, sob o espeque de uma imbecil revista. Será que todas as revistas feitas são assim? Parece-me que sim, dada a naturalidade com que todos naquela sala abordaram a policial. O que me trouxe ainda mais furor foi o pacto de mediocridade que as DEMAIS POLICIAIS, MULHERES, fizeram, pois sequer ponderaram acerca da atitude. Hei de reconhecer, contudo, que se trata da hierarquia, o que me sinaliza para a submissão de gênero, mais uma vez, onde nós, mulheres, cedemos em prol da violência.

Dupla violência do sistema: porque se trata do sistema, em si, sórdido e violento, com autoridades reproduzindo a lógica capilarizada de poder e definindo, no plano do real, critérios que passam por cima da dignidade humana. Violência por se tratar de uma mulher que, argumentando em relação ao constrangimento de se posicionar perante HOMENS - e não perante agentes - foi destratada, violada por eles.

A autoridade policial, repetindo como papagaio de pirata, a fala já cansativa "não é abuso", falava insistentemente não se tratar de excesso. Isso apenas mostra, para mim, a violência intrínseca do sistema de administração de injustiça, ainda corroborado pela violência de gênero.

Tststs: mal, MP, mal...Promotor do MPF-DF admite plágio em concurso

Promotor do MPF-DF admite plágio em concurso

O promotor Paulo José Leite Farias, do Ministério Público Federal do Distrito Federal, afirmou que vai devolver o prêmio de R$ 1,5 mil que recebeu por vencer um concurso de textos, após assumir que copiou trechos de uma dissertação de mestrado. A informação foi divulgada, nesta quinta-feira (17/2), no jornal O Estado de S. Paulo.

Em entrevista ao jornal, o promotor admitiu que a monografia "MPDFT - Evolução do Modelo de Promotor de Justiça Júpiter (garantidor da lei) para Hermes (protetor do interesse público)", apresentada no concurso em comemoração aos 50 anos do MPF-DF no ano passado, contém trechos iguais à dissertação de mestrado de Camila Villard Duran, defendida na Faculdade de Direito da USP em abril de 2008.

Ao ser questionado pela reportagem do Estadão, Farias informou primeiro que havia algumas “incongruências” em seu texto. Depois, escreveu por e-mail que devolverá a quantia recebida no concurso. “Pude constatar identidade de trechos, não só do corpo como de notas de rodapé, o que me chateou bastante”.

O promotor informou, ainda, que já notificou a Revista de Informação Legislativa do Senado, que recebeu o trabalho logo após Farias ser premiado, sobre o “plágio”. “Já notifiquei a revista desse erro e vão republicar o texto com os consertos já realizados na versão correta”.

Outro lado

Segundo o Estadão, Camila só soube que seu trabalho havia sido parcialmente plagiado em dezembro. Ela mora em Paris e cursa na Sorbonne, com bolsa da Capes, parte de seu doutorado que será defendido novamente na USP. “Recebi o texto por e-mail no fim do ano. Uma orientanda achou que eu gostaria de ver que meu nome estava citado no rodapé. Levei um susto, reconheci aquelas frases. Meu trabalho não foi citado, foi copiado”. Camila, que dá aulas na Fundação Getulio Vargas (FGV), disse que pode provar sua anterioridade em relação ao trabalho do promotor.

A dissertação de Camila foi publicada como livro, Direito e Moeda - O Controle dos Planos de Estabilização Monetária pelo Supremo Tribunal Federal, pela Editora Saraiva. O trabalho acadêmico, orientado pelo professor José Eduardo Faria, é uma análise de decisões judiciais brasileiras relativas a planos econômicos adotados pelo governo. Ela partiu de uma teoria sobre três diferentes tipos de juiz elaborada pelo jurista belga François Ost.

Camila não teve tempo de procurar a USP para denunciar o caso, mas enviou um e-mail à Saraiva. A editora afirma que analisará o material, antes de tomar providências.

De acordo com o jornal, Farias, nas duas publicações, apenas trocou a palavra juiz por promotor, para comentar a evolução da atuação dos membros do MPF-DF. Em 1998, ele, que defendeu mestrado sob orientação do ministro Gilmar Mendes, do STF, é doutor pela Universidade Federal de Pernambuco e pós-doutor pela Boston University.

Na Alemanha

Na quarta-feira (16/2), o jornal alemão Süddeutsche Zeitung publicou declarações do professor de Direito Andreas Fischer-Lescano, da Universidade de Bremen, que acusou o ministro da Defesa da Alemanha, Karl-Theodor zu Guttenberg, de plagiar trechos de sua tese de doutorado.

Segundo Lescano, nas passagens "plagiadas", o ministro utiliza citações e fórmulas idênticas a textos anteriormente publicados e trabalhos de outros autores, porém, sem citar fontes ou dar créditos. O caso está sendo investigado pelo professor Diethelm Klippel, ombudsman da Universidade de Bayreuth, onde Guttenberg apresentou a tese de doutorado, em 2006. O ministro declarou que "está disposto a verificar a qualquer momento se as 1.200 menções em notas de rodapé em 475 páginas" de sua tese têm alguma impropriedade.


FONTE/ORIGEM => http://www.conjur.com.br/2011-fev-17/promotor-assume-plagio-devolver-premio-15-mil

Sexta Turma admite suspensão condicional do processo em caso relacionado à Lei Maria da Penha

Sexta Turma admite suspensão condicional do processo em caso relacionado à Lei Maria da Penha

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, em um caso concreto, que a aplicação da suspensão condicional do processo não resultaria no afastamento ou diminuição das medidas protetivas à mulher previstas na Lei Maria da Penha (Lei n. 11340/2006). A decisão foi de encontro ao pensamento até então dominante na Turma, que não aplicava a suspensão, prevista no artigo 89 da Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei. N. 9099/95), aos casos relacionados à violência doméstica contra a mulher.

O relator do habeas corpus, desembargador convocado Celso Limongi, considerou que o caso em questão deveria ser julgado conforme o entendimento aceito por parte da doutrina. Segundo relatado no voto do relator, essa doutrina relativiza a aplicação da norma contida no artigo 41 da Lei Maria da Penha, que proíbe a aplicação da Lei n. 9.099/95 (juizados especiais) nos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher. Esses doutrinadores afirmam que ambas as leis estão no mesmo patamar de hierarquia e a constitucionalidade da Lei Maria da Penha não implica necessariamente a proibição de todas as normas processuais previstas na Lei n. 9.099/95, dentre elas a suspensão condicional do processo.

Para essa corrente, a suspensão condicional do processo tem caráter pedagógico e intimidador em relação ao agressor e não ofende os princípios da isonomia e da proteção da família. Além disso, a constitucionalidade da Lei Maria da Penha estaria balizada no princípio da isonomia e no artigo 226, parágrafo 8°, da Constituição Federal, por possibilitar a proteção da parte mais fraca da relação domésticas – a mulher – no âmbito processual e material. A corrente doutrinária apontada pelo magistrado afirma também que, até o momento, não se analisou se todos os mecanismos da Lei n. 9.099 são contrários à proteção assegurada pelo dispositivo constitucional citado. Ressaltam não ser possível generalizar a vedação do artigo 41 da Lei n. 11340/2006, cabendo ao Judiciário se manifestar sobre a eficácia da Lei.

A decisão da Turma em relação à aplicação da suspensão condicional do processo teve como base o pedido de um homem que foi denunciado por tentar sufocar sua companheira. Ele foi condenado à pena de três meses de detenção, substituída por prestação de serviços à comunidade. Segundo o acusado, o representante do Ministério Público deixou de oferecer a proposta de suspensão condicional do processo porque ele possuía outras incidências criminais praticadas contra a companheira. Apesar disso, o promotor de Justiça entrou com o pedido de suspensão, que foi negado pelo juiz, em virtude da proibição prevista no artigo 41 da Lei Maria da Penha.

No julgamento do habeas corpus, o relator, desembargador convocado Celso Limongi, afastou a interpretação literal do artigo 41 e cassou tanto o acórdão como a sentença. Com isso, determinou a realização de nova audiência para que o réu se manifeste sobre a proposta de suspensão condicional do processo. Segundo o relator, a suspensão condicional do processo não resulta em afastamento ou diminuição das medidas protetivas impostas à mulher. "E isto, porque, se o agente descumpre as condições impostas, o benefício pode ser revogado. E se reincidir na conduta, não poderá contar, uma segunda vez, com o ‘sursis’ processual", explica.

Marcadores sociais da diferença e repressão penal

"Marcadores sociais da diferença e repressão penal" que ocorrerá na UNESP - Campus de Franca-SP nos dias 12 a 15 de Abril." que ocorrerá na UNESP - Campus de Franca-SP nos dias 12 a 15 de Abril


PROGRAMAÇÃO

Terça-feira - 12/04/2011 - 19h00

A tutela penal dos Direitos Humanos: aspectos nacionais e internacionais

Prof. Dr. Paulo César Corrêa Borges (UNESP/SP)

Profa. Dra. Eloisa de Sousa Arruda (ESMP/PUC-SP)

Dr. Gustavo Octaviano Diniz Junqueira (EDEPE/SP/PUC-SP)

Quarta-feira - 13/04/2011 - 8h30:

O caráter jurídico-político da criminalização dos movimentos sociais

Profa. Dra. Silene de Moraes Freire (UERJ)

Profa. Dra. Maria Aparecida de Moraes (UFSCAR)

Quarta-feira - 13/04/2011 - 19h00:

O tratamento penal do deficiente intelectual: tutela ou penalização?

Prof. Hugo Nigro Mazzilli (ESMP)

Ms. Carmen Silvia Moraes Barros (EDEPE/SP)

Quinta-feira - 14/04/2011 - 8h30:

O direito às homossexualidades e suas formas de proteção jurídica

Profa. Dra. Débora Diniz (Unb/ Instituto Anis)

Profa. Dra. Regina Facchini (Unicamp/Instituto Pagu)

Maíra Coraci Diniz (EDEPE/SP)

Quinta-feira - 14/04/2011 - 19h00:

Revelando o visível: a persecução penal ao negro no Brasil

Profa. Dra. Eunice Prudente (USP)

Profa. Dra. Juliana Garcia Beloque (EDEPE/SP/USP)

Profa. Dra. Ísis Aparecida Conceição (USP)

Sexta-feira - 15/04/2011 – 8h30:

Feições da violência de gênero, doméstica e sexual contra mulher

Profa. Soledad García Muñoz (IIDH/Montevidéu)

Profa. Dra. Ana Lucia Sabadell (UFRJ)

Profa. Dra. Marisa Helena D´Arbo Alves de Freitas (UNESP)

Sexta-feira - 15/04/2011 – 19h00:

O efeito encantatório dos Direitos Humanos: desafios e novas perspectivas paradigmáticas

Prof. Dr. David Sánchez Rubio (Universidade Sevilha/ES)

Prof. Dr. Antonio Alberto Machado (UNESP)

Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes (UNESP)

INSCRIÇÕES

As inscrições para assistir ao evento devem ser enviadas até o dia 08/04/2011 para o e-mail tutelapenal@franca.unesp.br, contendo: nome completo, instituição, profissão e comprovante de depósito identificado*.

Depósito identificado Valores**:

Banco do Brasil Profissionais: R$ 50,00

Ag. 6520-x Estudantes: R$ 30,00

c.c. 300.561-5

* Aos ouvintes, devidamente inscritos, serão conferidos certificados de 20 horas/aula.

** A submissão de trabalho científico é gratuita, e o(a)(s) autor(a)(s) receberá certificado pela respectiva apresentação nas sessões de comunicações.

APRESENTAÇÕES DE COMUNICAÇÕES

Para a apresentação de comunicações não é necessária a inscrição para assistir ao evento.

Os envios de trabalhos até 31/03/2011 para: tutelapenal@franca.unesp.br

Diretrizes: http://www.franca.unesp.br/posdireito/interno-posdir_eventos.php

Eixos temáticos:

12/04/11: Tutela penal dos Direitos Humanos

13/04/11: Criminalização dos movimentos sociais e tratamento penal do deficiente intelectual

14/04/11: Persecução penal ao negro no Brasil e Homossexualidades e proteções jurídicas

15/04/11: Violência de gênero, doméstica e sexual contra mulher

APOIO INSTITUCIONAL

Escola Superior do Ministério Público do Estado de São Paulo – ESMP/SP

Escola da Defensoria Pública do Estado de São Paulo – EDEPE/SP

Núcleo de Estudos da Tutela Penal dos Direitos Humanos – NETPDH

INFORMAÇÕES

Av Eufrásia Monteiro Petráglia, 900

Jd. Dr. Antonio Petráglia - CEP 14409-160

Telefone: (16) 3706-8712

e-mail : tutelapenal@franca.unesp.br ou posgrad@franca.unesp.br

home page : http://www.franca.unesp.br/posdireito

Tribunal do Júri, Justiça Federal e crimes dolosos contra a vida no caso de genocídio

O genocídio é uma espécie delituosa muito interessante, tendo em vista que traz uma tipologia de sujeito passivo diferenciada em face de etnia, raça e religião (segundo o art. 1o. da Lei 2.889/56).

Já observamos que os crimes dolosos contra a vida são julgados pelo Tribunal do Júri, segundo disposição constitucional expressa numa garantia referendada no art. 5o., XXXVIII. Questão debatida é saber se, diante da natureza sui generis do genocídio como sendo uma estrutura delitiva em face de direitos humanos, quem teria o monopólio de julgamento do crime, diante da redação nova dada pela Emenda 45 ao art. 109, V-A c/c parágrafo 5o. do mesmo artigo?

O que prevalece? A regra constante do art. 109 ou a garantia que expressa a tutela de um direito fundamental?

Vejamos o art. 109:

"V-A - as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo;
(...)
§ 5º Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal."

Bom, e daí?

Daí que num eventual incidente de deslocamento de competência para o Superior Tribunal de Justiça suscitado pelo PGR (discricionariedade) em face da sui generis natureza do bem jurídico tutelado, o STJ já se posicionou no sentido de ser área afeta à Justiça Federal, dada a particularidade do bem jurídico. Resta saber se da competência de um juiz singular ou de um Tribunal. Certamente seria o caso de um Tribunal do Júri Federal!

Ou seja, insisto e bato o martelo na competência do Júri que, no caso, é federalizado, em face da supremacia no art. 5o.

Mas acosto a jurisprudência do STJ em parte do raciocínio...

CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL - RECURSO ESPECIAL - CRIMINAL -
CRIME DE GENOCÍDIO CONEXO COM OUTROS DELITOS - COMPETÊNCIA - JUSTIÇA
FEDERAL - JUIZ SINGULAR - ETNIA - ÍNDIOS YANOMAMI - ALÍNEA "A", DO
ART. 1º, DA LEI Nº 2.889/56 C/C ART. 74, PARÁG. 1º, DO CPP E ART.
5º, XXXVIII, DA CF - PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO - CONHECIMENTO -
SENTENÇA MONOCRÁTICA RESTABELECIDA.
1 - Inicialmente, reconhecida extinta a punibilidade de FRANCISCO
ALVES RODRIGUES, em virtude de seu falecimento, conforme certidão de
óbito juntada às fls. 1.807 dos autos (art. 107, I, CP).
2 - Aos réus-recorridos é imputada a perpetração dos delitos de
lavra garimpeira ilegal, contrabando ou descaminho, ocultação de
cadáver, dano, formação de quadrilha ou bando, todos em conexão com
genocídio e associação para o genocídio, na figura da alínea "a", do
art. 1.º da Lei n.º 2.889/56, cometidos contra os índios YANOMAMI,
no chamado "MASSACRE DE HAXIMÚ", que resultou na morte de 12
índios, sendo 01 homem adulto, 02 mulheres, 01 idosa cega, 03 moças
e 05 crianças (entre 01 e 08 anos de idade), bem como em 03 índios
feridos, entre eles, 02 crianças.
3 - Esta Corte, através de seu Órgão Especial, posicionou-se no
sentido de que a violação à determinada norma legal ou dissídio
sobre sua interpretação, não requer, necessariamente, que tal
dispositivo tenha sido expressamente mencionado no v. acórdão do
Tribunal de origem. Cuida-se do chamado prequestionamento implícito
(cf. EREsp nºs 181.682/PE, 144.844/RS e 155.321/SP). Sendo a
hipótese dos autos, afasta-se a aplicabilidade da Súmula 356/STF
para conhecer do recurso, no tocante à suposta infringência aos
arts. 74, parág. 1º, do Código de Processo Penal e 1º, "a", da Lei
nº 2.889/56.
4 - Como bem asseverado pela r. sentença e pelo v. decisum
colegiado, cuida-se, primeiramente, de competência federal,
porquanto deflui do fato de terem sido praticados delitos penais em
detrimento de bens tutelados pela União Federal, envolvendo, no caso
concreto, direitos indígenas, entre eles, o direito maior à própria
vida (art. 109, incisos IV e XI, da Constituição Federal).
Precedente do STF (RE nº 179.485/2-AM). Logo, a esta Corte de
Uniformização sobeja, apenas e tão somente, a análise do crime de
genocídio e a competência para seu julgamento, em face ao art. 74,
parág. 1º, do Código de Processo Penal, tido como violado.
5 - Pratica genocídio quem, intencionalmente, pretende destruir, no
todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso,
cometendo, para tanto, atos como o assassinato de membros do grupo,
dano grave à sua integridade física ou mental, submissão intencional
destes ou, ainda, tome medidas a impedir os nascimentos no seio do
grupo, bem como promova a transferência forçada de menores do grupo
para outro. Inteligência dos arts. 2º da Convenção Contra o
Genocídio, ratificada pelo Decreto nº 30.822/52, c/c 1º, alínea "a",
da Lei nº 2.889/56.
6 - Neste diapasão, no caso sub judice, o bem jurídico tutelado não
é a vida do indivíduo considerado em si mesmo, mas sim a vida em
comum do grupo de homens ou parte deste, ou seja, da comunidade de
povos, mais precisamente, da etnia dos silvícolas integrantes da
tribo HAXIMÚ, dos YANOMAMI, localizada em terras férteis para a
lavra garimpeira.
7 - O crime de genocídio têm objetividade jurídica, tipos objetivos
e subjetivos, bem como sujeito passivo, inteiramente distintos
daqueles arrolados como crimes contra a vida. Assim, a idéia de
submeter tal crime ao Tribunal do Júri encontra óbice no próprio
ordenamento processual penal, porquanto não há em seu bojo previsão
para este delito, sendo possível apenas e somente a condenação dos
crimes especificamente nele previstos, não se podendo neles incluir,
desta forma, qualquer crime que haja morte da vítima, ainda que
causada dolosamente. Aplicação dos arts. 5º, inciso XXXVIII, da
Constituição Federal c/c 74, parág. 1º, do Código de Processo Penal.
8 - Recurso conhecido e provido para, reformando o v. aresto a quo,
declarar competente o Juiz Singular Federal para apreciar os delitos
arrolados na denúncia, devendo o Tribunal de origem julgar as
apelações que restaram, naquela oportunidade, prejudicadas, bem como
o pedido de liberdade provisória formulado às fls. 1.823/1.832
destes autos. Decretada extinta a punibilidade em relação ao réu
FRANCISCO ALVES RODRIGUES, nos termos do art. 107, I, do CP, em
razão de seu falecimento.(REsp 222653 / RR - Ministro JORGE SCARTEZZINI - QUINTA TURMA - 2010)

Homicídio simples e hediondez

Hoje o assunto da aula foi a discussão sobre a hediondez do homicídio simples, uma questão que trouxe aquela adrenalina (ao menos em mim, mas sou suspeita, porque, afinal, adoro uma polêmica e a sacudidela no que é tomado como dogma).

Pois bem, enfim. Olhamos o art. 1o. da Lei 8.072, que faz referência à seguinte catalogação: "homicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado (art. 121, § 2o, I, II, III, IV e V)".

Uma primeira consideração diz respeito ao fato da Lei Hedionda não "criar" novos tipos penais, mas trabalhar com o que já existe, ao menos em tese, tendo em vista que traz a referência à "(art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente".

A infelicidade da lei (além de ela ser um poço de atrocidades jurídicas) diz respeito a uma suposta polêmica em relação a se questionar se o homicídio "simples" é taxado como hediondo. Entendo que a polêmica é apenas APARENTE em função do bom e velho princípio da legalidade, pois, se observada a redação, a lei-hedionda não fala em "art. 121, caput", mas em "(art. 121), quando praticado (...)", de modo a afastar, por vedação expressa, a hediondez do omicídio simples.

Se prestarmos, ainda, atenção nos demais dispositivos, poderemos notar que, quando a lei-hedionda quis, ela fez menção expressa ao "caput", elencando, assim, em tese, as disposições de cabeça de artigos, ou seja, os conteúdos contidos na explicitação dos tipos simples. Com isso cai por terra o argumento de hediondez do homicídio simples.

Mas, apenas para chutar a hedionda-lei natimorta, podemos também observar que é insustentável a incursão do homicídio simples no rol dos crimes hediondos em face da incompatibilidade em sustentá-lo ao lado do qualificado como sendo AMBOS objeto de algumas vedações, tendo em vista que os tipos (simples e qualificado) trazem quantidades distintas de lesividade a bem jurídico, de proporcionalidade de faixa de pena e, sobretudo, de reprovabilidade, já que as motivações subjetivas difereciam esses dois tipos penais.

No qualificado, existem motivos que tornam a conduta mais deplorável, como torpeza, futilidade, enquanto no simples inexiste abjeção, em face de ser o simples, inclusive, um tipo penal residual, que não conta com um vast rol (como o qualificado) de situações anti-éticas que deploram mais o crime.

Aff, alguém ainda insiste na tecla de hediondez?

Espero que não.

Então, recapitulando...

Não é hediondo...

a) legalidade estrita, pois a lei não traz a referência expressa ao caput;

b) homicídio simples e qualificado não podem ser tratados da mesma maneira, pois possuem quantidades distintas de lesividade a bem jurídico, de proporcionalidade de faixa de pena e, sobretudo, de reprovabilidade, já que as motivações subjetivas difereciam esses dois tipos penais. Seria uma burla à ISONOMIA...

Inté!

Juiz relaxa prisão por falta de vaga em presídio

Começando a semana com sentenças intrépidas e corajosas... Percebam o detalhe batido e debatido em sala de aula: PRINCÍPIO DA DIGNIDADE sempre presente como fundamento de decisões!!!

Chega até a ser simples a argumentação, por estar ÓBVIA na CF/88: a questão é executoriedade que, no caso do sistema penal e penitenciário brasileiro, falta um pouco a juízes e juízas medrosos e medrosas.

Boa semana!!


Por Gabriela Rocha

O juiz João Marcos Buch, da 2ª Vara Criminal de Joinville (SC), relaxou a prisão em flagrante de um preso para garantir sua dignidade e integridade física e moral. Como a transferência ao Presídio Regional de Joinville foi negada diante da lotação do estabelecimento, o juiz entendeu que a Central de Polícia de Joinville não tem as mínimas condições sanitárias e de segurança para manter pessoas detidas e o libertou.

Na sentença, concedida na última quinta-feira (10/2), Buch considerou que se o preso em flagrante por roubo continuasse na Central de Polícia, sua dignidade seria violada. Assim, declarou que “este Juízo, que mantém a custódia, sob sua responsabilidade, não compactuará com violações desta natureza, jamais. Mesmo porque trata-se de prisão provisória, ou seja, sem julgamento e sentença condenatória transitada em julgado e delito em tese imputado que, muito embora cometido com grave ameaça contra pessoa, não extravasou a mera tipicidade legal”.

A decisão foi baseada nos artigos 1º, inciso III, 5º inciso XLIV e 144 parágrafo 4º, todos da Constituição Federal, que dizem, respectivamente, o seguinte: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: a dignidade da pessoa humana”; “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” e “às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares”.

O juiz mencionou, ainda, o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade ao dizer que numa sociedade que tem como princípio fundamental a dignidade da pessoa humana e o objetivo de ser livre, justa e solidária “não é razoável e muito menos proporcional manter um indivíduo preso numa Central de Polícia desprovida legal e factualmente de capacidade de encarceramento”.

Buch levou em conta que a autoridade policial informou que em contato com o diretor do presídio de Joinville, foi relatada a falta de vagas, “razão pela qual não pode receber o preso, permanecendo este na precária carceragem da Central de Polícia de Joinville". No próprio relato, é mencionada a condição do estabelecimento, que, segundo o juiz é notória.

aqui, a íntegra da sentença http://s.conjur.com.br/dl/juiz-solta-preso-dignidade.pdf

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Sentença da melancia

Essa aqui também é uma pérola nos achados... Trata-se da decisão de um juiz no Tocantins (R.G.P), deferindo a liberdade de dois homens acusados do furto de 2 melancias.

Vou omitir os nomes dos acusados porque, ainda que tenham sido beneficiados, entendo que o fato de ingressarem no sistema judicial já é, no caso deles, constrangimento.


"DECISÃO

Trata-se de auto de prisão em flagrante de SRR e HRR, que foram detidos em virtude do suposto furto de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.

Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional).

Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém.

Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário.

Poderia brandir minha ira contra os neo-liberais, o consenso de

Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização européia.

Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra - e aí, cadê a Justiça nesse mundo?

Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.

Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir.

Simplesmente mandarei soltar os indiciados.

Quem quiser que escolha o motivo.

Expeçam-se os alvarás. Intimem-se"

Sentença de Tiradentes

A quem interessar possa, estou postando a parte da sentença de Tiradentes.

O restante está disponível no link a seguir:http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=612

Achei interessante postar isso porque, durante essa semana, nossa conversa na sala de aula (Direito Penal 2) disse respeito às atrocidades feitas por Portugal na repressão dos crimes cometidos aqui na colônia, desmistificando a ideia de pacificidade em relação a como a matriz decidia os conflitos no Brasil-colônia.

Primeiro, a acusação... óooooo!! Claro que se trata de uma reprimenda política... Prestem atenção na parte que negritei e alinhei:

"ACCORDÃO em Relação os da Alçada etc.

Vistos este autos que em observância das ordens da dita senhora se fizeram summários aos vinte e nove Réus pronunciados conteudos na relação folhas 14 verso, devassas, perguntas apensos de defesa allegada pelo Procurador que lhe foi nomeado etc, Mostra-se que na Capitania de Minas alguns Vassallos da dita Senhora, animados do espírito de perfídia ambição, formaram um infame plano para se subtrahirem da sujeição, e obediência devida a mesma senhora; pretendendo desmembrar, e separar do Estado aquella Capitania, para formarem uma república independente, por meio de urna formal rebelião da qual se erigiram em chefes e cabeças seduzindo a uns para ajudarem, e concorrerem para aquella perfida acção, e communicando a outros os seus atrozes, e abomináveis intentos, em que todos guardavam maliciosamente o mais inviolável silêncio; para que a conjuração pudesse produzir effeito, que todos mostravam desejar, pelo segredo e cautela, com que se reservaram de que chegasse à notícia do Governador, e Ministros porque este era o meio de levarem avante aquelle horrendo attentado, urgido pela infidelidade e perfídia: Pelo que não só os chefes cabeças da Conjuração, e os ajudadores da rebelião, se constituíram Réus do crime de Lesa Magestade da primeira cabeça, mas também os sabedores, e consentidores della pelo seu silêncio; sendo tal a maldade e prevaricação destes Réus, que sem remorsos faltaram à mais incomendável obrigação de Vassallos e de Catholicos, e sem horror contrahiram a infâmia de traidores, sempre inherente, e anexa a tão enorme, e detestável delicto."

Bom, agora a sentença de uma morte bem cruenta. Só faltou dar bordoada nos despojos do heroi nacional. Importante a leitura disso, para que nos lembremos de nossa "herança" de sangue em termos de aplicação de dor e suplício.

Mudanças se fazem a partir da consciência do passado, do presente e da modificação pessoal e coletiva para o futuro. Como diria Baratta, para a sociedade mudar, precisamos NÓS de mudanças.

"Portanto condenam ao Réu Joaquim José da Silva Xavier por alcunha o Tiradentes Alferes que foi da tropa paga da Capitania de Minas a que com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas publicas ao lugar da forca e nella morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Villa Rica aonde em lugar mais publico della será pregada, em um poste alto até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes pelo caminho de Minas no sitio da Varginha e das Sebolas aonde o Réu teve as suas infames práticas e os mais nos sitios (sic) de maiores povoações até que o tempo também os consuma; declaram o Réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens applicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Villa Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados e no mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infamia deste abominavel Réu"

DIREITO PENAL 3 - CRIMES EM ESPÉCIE - HOMICÍDIO SIMPLES E PRIVILEGIADO

Saindo do forno, minha gente! O roteiro de nosso bate-papo da semana. Quero dizer, acho que dará tempo de ingressar no homicídio qualificado, mas, mesmo assim, vamos com calma. Para amanhã e quarta (turmas de penal), eis o link, ok?

Lembrando que está nos meus arquivos do 4shared: http://www.4shared.com/document/9dTfdJtP/UNIDADE_1HOMICDIOANLISE_DO_TIP.html

Soberania do Tribunal do Júri vale mesmo diante de decisões contraditórias

Ow, já que falamos sobre Tribunal do Júri na semana passada, aí vai um post do Superior Tribunal de Justiça, em 17/02/2011 - 13h24. O link está disponível em http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=100811


DECISÃO
Soberania do Tribunal do Júri vale mesmo diante de decisões contraditórias

A soberania dos vereditos dos tribunais do Júri, garantida pela Constituição Federal, deve ser respeitada mesmo que as decisões dos jurados não pareçam as mais justas. Com esse entendimento, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou possível que um homem fosse condenado pela morte do enteado, ainda que tivesse sido absolvido da morte de seu próprio filho, ocorrida no mesmo episódio – um incêndio. Os casos foram julgados em júris diversos.

Segundo a acusação, o condenado teria cometido os dois homicídios, mais um crime de incêndio, em 1997. Submetido a julgamento popular, foi condenado às penas de 20 anos de reclusão, pela morte do filho, e de 17 anos, pelo assassinato do enteado.

A defesa recorreu das penas, protestando por novo júri no primeiro caso – já que a pena era superior a 20 anos – e apelando no segundo. No novo júri, os jurados afastaram a qualificadora de motivo cruel e reconheceram a presença de atenuante genérica, reduzindo a pena para 12 anos de reclusão.

Dessa segunda decisão, recorreram a defesa – que sustentou nulidade da pronúncia e necessidade de renovação dos julgamentos, em razão do afastamento da qualificadora contra uma das vítimas – e o Ministério Público (MP), que alegou anulação da sentença por ser contrária às provas.

Absolvição

O tribunal local acolheu apenas o recurso do MP, levando ao terceiro julgamento o crime contra o filho do condenado. Neste, os jurados, por quatro votos a três, rejeitaram a autoria do delito, absolvendo o pai quanto à morte do filho.

Diante da nova decisão, a defesa ajuizou revisão criminal, visando conciliar as duas decisões antagônicas. A pretensão foi negada pelo tribunal local, o que levou à impetração do habeas corpus no STJ.

Para os defensores, o ato praticado configura crime continuado, o que forçaria a absolvição quanto ao segundo homicídio, em razão da absolvição no primeiro. Para a defesa, os delitos imputados teriam sido supostamente praticados em conjunto, na mesma data e no mesmo contexto, o que levaria à extensão da decisão absolutória em relação a uma das vítimas ao outro crime.

Soberania

Para o relator, ministro Og Fernandes, no entanto, as decisões proferidas pelos jurados em tribunal popular estão protegidas constitucionalmente pela soberania dos vereditos. “Essa cláusula [CF, artigo 5º, XVIII, c], por certo, implica que tais decisões – pareçam ou não a mais justa – hão de ser respeitadas”, afirmou.

Além disso, o habeas corpus não serviria para reanalisar as provas, de modo a concluir diversamente das instâncias ordinárias em relação à existência de concurso material ou formal. Apenas na segunda hipótese a tese da extensão da absolutória poderia ser considerada.

O relator acrescentou, ainda, que a tese já foi apreciada pelo próprio STJ no momento oportuno, quando a defesa questionou um dos julgamentos por meio de habeas corpus, em 2001. Naquele momento, o Tribunal entendeu que a defesa não havia levantado até ali, em nenhuma fase do processo, a tese do concurso formal. Para o ministro, isso seria uma tentativa de levar o STJ a reapreciar, por via oblíqua, tese já refutada.


Coordenadoria de Editoria e Imprensa

Direito penal e religitimação sistêmica

Em parte do meu livro falo muito em relegitimação sistêmica seria uma reformulação do sistema penal, a partir da ideia de que ele, hoje, não cumpre, como, de fato, nunca cumpriu um compromisso de eficiência em termos de controle penal.

Em meu pensar, ele cumpre - segundo o livro - apenas uma função SIMBÓLICA de controle e docilização de MASSAS, sendo seletivo, discriminatório, aviltante etc.

Ele nunca teria cumprido missão de pacificação porque surgiu, desde sua formação, como proposta economicamente rentável para formação de mão-de-obra barata para o sistema capitalista (ver ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO CAPITALISMO, Weber).

Ironicamente, destina-se a encarcerar quem não detém os bens de consumo e, não tendo acesso aos bens jurídicos que não são partilhados, violam bens alheios, alijando-se da distribuição de renda.

Daí a necessidade de repensar o sistema.

Relegimitação pressupõe busca de novos fundamentos para se modificar estruturalmente o sistema penal (ou aboli-lo), por meio de políticas cidadãs de controle social punitivo. Ou seja, chamando os membros da sociedade plúrima para pensarem e atuarem como agentes de mudanças em relação aos destinos do sistema penal. Uma espécie de comunitarismo político-criminal no qual participamos, como cidadãos e cidadãs conscientes, de políticas públicas de intervenção.

Em relação à maneira como alguns abolocionistas propoõem respostas ao crime praticado, a mais comum é a intervenção terapêutica, bem como na proposta de diálogo com a justiça restaurativa.

Ao contrário do que podemos imaginar, a questão de ofensor e vítima (ou família) "sentar ao lado" tem funcionado bem nos países que a adotam. Segundo pesquisas, é saudável, pois a vítima ou os familiares "pagam o sapo", dialogam, falam, expõem suas demandas e, depois, sentem-se aliviados.

Aqui no Brasil isso foi praticado com a família do menino Ives Ota. Depois do encontro, o pai, que era partidário da pena de morte, mudou de opinião. É a chamada "mediação ofensor-vítima" ou justiça restaurativa.

Posto um blog legal: http://www.arcos.org.br/livros/estudos-de-arbitragem-mediacao-e-negociacao-vol4/parte-iii-doutrina-artigo-dos-professores/justica-restaurativa-por-meio-da-mediacao-vitima-ofensor-uma-avaliacao-a-partir-de-varias-experiencias-locais/.

Bom, é isso.

DIREITO PENAL 3 - CRIMES EM ESPÉCIE - UNIDADE 1

Bom domingo, pessoal de Direito Penal 3 (crimes em espécie)!

Estou enviando o link do roteiro de aula da semana passada, lembrando que paramos a discussão na parte de classificação do crime de homicídio/femicídio, exatamente na parte em que pedi para lerem o inteiro teor do acórdão sobre a MATERIALIDADE do crime ser demonstrada por exame indireto, usando DNA.

Lembro também que esgotamos a discussão sobre a) competência para julgamento do latrocínio, usando a Súmula 603 do STF e conversando sobre a atração de competência no caso de o crime principal ser HOMICÍDIO; b) necessidade de observar a pena, pois, no caso do HOMICÍDIO CULPOSO, poderemos ter a suspensão condicional do processo (ou seja, nem desfecho terá em termos de condenação, pois, como vimos, o feito poderá ser paralisado, com a extinção da necessidade de punição).

O link da aula da semana passada está disponível em: http://www.4shared.com/document/QHiXrQ-C/UNIDADE_1HOMICDIO1.html.

Boa leitura!

Daqui a pouco enviarei o material dessa semana, ou parte dele!

Textos EXTRA de Direito Penal 2

Pessoal de Direito Penal 2 (Pena e aplicação da pena)!!!

Estou postando os links de dois textos EXTRA, recomendados em sala de aula.

O primeiro deles fala sobre os FINS DA PENA, dialogando com as teorias estudadas em sala (retributivas, preventivas, neoretribucionistas, nova prevenção e ecléticas).

Os autores são Emérson de Oliveira Longhi e Cláudio Ribeiro Lopes. Está disponível em PDF: http://www.4shared.com/document/yLB4wFaU/TEXTOFINS_DA_PENA.html.

O outro texto é o capítulo do meu livro, onde abordo algumas teorias críticas sobre a pena e o sistema penal. O link é http://www.4shared.com/document/h36Y-gpO/captulolivropena.html.

Boa leitura!

Direito Penal 2: UNIDADE 1 - PENA - AULA 1

Oi, pessoal! Não conseguindo fazer a transposição integral do 4shared, estou postando o link aula a aula, ok? Trata-se do roteiro das nossas aulas durante a semana passada e parte dessa semana.

Está disponível em http://www.4shared.com/document/EZFnJWvb/UNIDADE_1FINSSISTEMAS_PENITENC.html

Arquivos de aulas

Oi, pessoal de Direito Penal 2 e 3! Bom domingo!

Tudo bem? Estou trabalhando aqui no sentido de incluir no próprio blog o link para o 4shared, local onde hospedo meus arquivos de aula, bem como textos e capítulos de livros. Ainda não consegui, mas penso que até o final do dia anexarei tudo!

Inté!

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Homicídio/femicídio SEM cadáver?

Claro!

Uai, não assistimos DIRETO o pessoal do C.S.I. com suas tecnologias de ponta?

Pois bem, em 1998 houve a polêmica, aqui no DF, do assassinato da jovem Michelle de Oliveira Barbosa, que não deixou vestígios. Acho que algo similar será feito no caso de Elisa Samúdio. Enfim, no site do Tribunal de Justiça do DF encontrei o acórdão do julgamento, na época, do recurso em sentido estrito, em que a defesa se irresigna contra o exame indireto de DNA.

Eis o número do prcesso: RSE 1999 01 1 070156-5.

O link da EMENTA do acórdão é http://tjdf19.tjdft.jus.br/cgi-bin/tjcgi1?DOCNUM=4&PGATU=1&l=20&ID=62142,37746,1324&MGWLPN=SERVIDOR1&NXTPGM=jrhtm03&OPT=&ORIGEM=INTER

Sugiro entrar no INTEIRO TEOR para a leitura.

Inté!

Teoria da pena: que árdua tarefa para uma alma!!!

Um detalhe interessante tem marcado as reflexões sobre teoria da pena. Em vários momentos, indaguei dos alunos e das alunas sobre a ideia embrionária que têm em mente quando falamos em "pena".

Fiquei feliz em saber que, ao final, boa parte dos verbetes colocados no quadro trazem uma pesada e densa carga semântica relacionada à DOR, SOFRIMENTO. Alguns ou algumas pensaram em "justiça", mas, como não falaram, fica o ato falho freudiano: ao final, a concepção que trazemos sobre a sanção penal não se cerca da beleza poética do fracassado jusnaturalismo. Muito menos da robotização do positivismo, mas, antes, agrega o que de pior conseguimos captar como sendo instrumento de suplício.

Depois de pesquisar algumas etimologias, nada me surpreendeu. Seja qual for a etimologia (poena (latim): sofrimento / ponos (grego): dor / punya (sânscrito): purificação), a ideia original de pena está intrinsecamente vinculada à expiação, ao suplício, à dor e à violência, evidenciando a forte influência do direito canônico (de matiz judaico-cristã a expressar culpabilidade) e demais raízes de natureza ético-religiosa.

Estaria ainda presente em nosso universo simbólico (em nossas mentes, práticas e preconceitos?) a vinculação da pena a uma matiz religiosa?

Penso que sim, observando no dia-a-dia das salas de audiência o discurso reproduzido automaticamente por juízes e juízas a respeito do que "é certo" ou "errado" (num binário pífio que, ao final, "engaveta" as pessoas segundo "uma banda do bem" e "uma horda do mal"), bem como, nas várias ocasiões em que, fazendo pesquisa de campo para a tese, observei alguns ou algumas fazendo verdadeiras preleções moralizantes e religiosamente vinculadas a uma ideologia.

Um problema, quando se trata de um ordenamento jurídico que optou por prestigiar a laicidade do Estado, dentro da predileção dos Estados liberais e sociais-democratas que tutelam a DIVERSIDADE. Minha ponderação, dentro disso: estariam os magistrados, as magistradas, os promotores, as promotoras, os advogados e as advogadas atuando segundo uma liturgia que reproduz preconceitos de classe? De credo? De gênero?

Em caso positivo, qual o problema disso? Hehehe, básico: o Estado não pode agir com favoritismos, sob pena de passar por cima das regras básicas por ele mesmo criadas em relação a não agir com arbitrariedade. Claro que isso, num plano do "dever ser", porque, segundo Zaffaroni, no plano ôntico (do ser), tudo isso já existe e inspira a arbitrariedade.

Muito difícil mesmo o despojamento - dentro da aplicação da pena - desses enunciados ético-religiosos, pela própria simbologia que cerca a pena, reproduzida na dureza e na verve sanguinolenta - herança dos nossos ancestrais romanos - que enviou muita gente para o Coliseu e, posteriomente, para a fogueira.

Gosto muito de perceber a pena pelo que ela é, não pelo que ela, em tese, poderia ser. Acho mais honesto, coerente, menos hipócrita e mais "pé no chão". Percebo-a como um instrumento político-criminal de controle social que, segundo Castro, traz um conteúdo designativo da predisposição de estratégias, táticas e forças socialmente engendradas na construção de mecanismos de submissão forçada dos que não interagem com a ideologia dominante, nem se submetem ao consenso reconhecido como legítimo, restando evidente, nesta visão, uma percepção de ordem coativa subjacente à capacidade auto-regulatória (1987, p. 119). Controle social, assim, seria sinônimo de auto-regulação. O direito penal seria APENAS UMA, DENTRE VÁRIAS MODALIDADES DE EXERCÍCIO DE CONTROLE SOCIAL.

O que me causa espanto é acreditar que ele seja - juntamente com a pena - tomado como "tábua de salvação" ou meio ÚNICO de "extirpação" ou "combate" de criminalidade, "meio de RESOLUÇÃO de conflitos": uma utopia! Quando muito, mecanismo de GESTÃO, ADMINISTRAÇÃO, pois os conflitos, grosso modo, nunca trazem uma resolução hábil a representar satisfação plena para todos e todas os envolvidos e envolvidas...

Dentro do direito penal e da criminologia, Dias e Andrade abordam o controle social sob a perspectiva de construção dos mecanismos de resposta da sociedade ao crime, quer seja por meio da criação do deviance manifestada tanto na produção de leis, como na aplicação e estigmatização dos indivíduos, tarefa desempenhada por determinadas instâncias de atuação (1997, p. 365-372).

Tomando por base a riqueza do tema, poderia ser indagada certa inexatidão que a expressão controle social possui, por designar tanto uma imposição de ordem consensual, quanto como um fomento à exclusão e a classificação dos indivíduos em transgressores ou não, passando, outrossim, pela compreensão do controle como instrumento de manutenção de estruturas de justificação e legitimação de uma ordem seletiva, discriminatória e estigmatizante, num contexto de primazia do conflito de base democrática e de respeito aos direitos civis.

Por isso prefiro uma compreensão de controle social punitivo (no caso, direito penal e pena) como auto-regulação social, suscitada e motivada, no âmbito de seus grupos, pela compreensão cidadã de incremento dos pilares de gerenciamento interno das condutas tidas como não desejáveis, admitidas de acordo com a divergência existente entre os interesses desses mesmos grupos, na qual a seletividade, a extirpação, a intolerância e a exclusão cederiam espaço ao convívio de dissensos, afastando da minoria detentora do poder de catalogação, o monopólio da dicção do critério definidor do desvio cometido, para reparti-lo com os demais grupos societários, como expressão cidadã da emancipação reguladora.

Tudo que estiver longe disso (ou seja, nosso direito penal atual, sistema penal e carcerário) apenas reproduz uma ordem jurídica simbólica, estruturadora dos princípios regentes dentro do sistema, servindo como parâmetro legal e legitimado por uma ideologia prevalecente que determina as práticas condizentes com um mecanismo de dominação, bem como aquelas desviantes que dele refogem. Uma MATRIX. Devaneio?

Não, penso que o devaneio, se existe, está no olhar ingênuo com que insistimos em olhar um dever ser que nunca é...

Vida e patrimônio: aprendendo a prequestionar matéria desde já...

Vamos lá...

Crimes contra a pessoa e o patrimônio...

O primeiro caminho - penso - está na articulação do raciocínio na CF/88, como comentei antes.

O art. 5o., caput traz o rol, sempre interpretado diante do compromisso de salvaguarda da dignidade (art. 1o.), assunto top de linha em termos de constitucionalismo, porque, claro, não podemos esquecer que a CF/88 traz uma agenda de compromisso estatal com pactos, tratados e convenções internacionais (ex vi Pacto de São José da Costa Rica), que prestigiam a proteção da dignidade, bem como a adoção de uma política pública (leia-se jurídica) de hermenêutica voltada para a proteção desse princípio fundamental.

Sendo recepcionado pela CF/88, o CPB elenca (basta ver no índice sistemático, antes dos artigos) o rol que foi delineado na Constituição, iniciando o percurso pelo EU (pessoa - vida - incolumidades) e, depois, pelo MEU, em nítidos posicionamentos de prestígio dos direitos individuais que foram, na História, ligados ao liberalismo econômico.

Daí a roupagem "bonita": art. 1 + art 5, caput + art. 121 (por exemplo). O básico para qualquer percurso. Qual a inovação? Qual a importância disso?

Ué, daqui a pouco - com a entrada do Ministro FUX - o STF julgará o tema relacionado às células-tronco, inovando em termos de definição jurídica dos critérios para se posicionar acerca da tutela da vida (tema transdisciplinar, que envolve a biotética).

Isso traz uma mudança VETORIAL no campo do direito penal, tendo em vista que temas polêmicos (e que trazem franzir de testas) serão revividos, como a eutanásia (modalidade de homi-femicídio privilegiado), o aborto, a reprodução assistida etc..

Mais um motivo para se observar que prequestionamento se começa no berço mesmo!

Considerações sobre o estudo constitucional da tutela sobre a VIDA e o PATRIMÔNIO

Sempre que entro numa sala de aula de direito penal (escrito com letra minúscula porque entendo que não se trata de ciência, mas de teknè, ou seja, técnica) para conversar a respeito dos chamados "crimes em espécie" (descritos a partir da parte especial, desde o art. 120), reflito sobre a precariedade do estudo de uma dogmática penal que não considere a articulação com o direito constitucional.

Afinal, sendo hierárquica e imediatamente posicionado em um locus (local) de supremacia, nào seria desarrazoado afirmar que a Constituição (e não o CPB) é o primeiro foco de ordenamento jurídico a esquadrinhas e escalonar os bens jurídicos que serão tutelados infraconstitucionalmente.

Dentro disso - penso - o estudo de direito penal começa na CF/88, conjugando, ainda, a preocupação com a dimensão moderna de interpretação que prestigie o princípio da dignidade humana, desde o art. 1o. até a "primeira lista" de bens jurídicos tutelados, o caput do art. 5o.

O estudo analítico do tipo penal contido no art. 121 possui uma vasta estrutura - densa estrutura - de análise, sendo necessário, com isso, começar a argumentação jurídica de tutela a partir o eixo central, numa construção bem interessante...

O art. 5o., caput, da CF/88 elenca, de acordo com o texto, os primeiros bens jurídicos: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade".

Vida, liberdade, segurança e propriedade, enunciados ou referências (modelos ou valores) denominados bens jurídico, que nada mais são do que zonas de interesses (de cunho ético-social) DEFINIDOS politicamente por quem exerce o exercício do poder tido como legítimo e, dentro disso, elabora um rol de valores que entende ser relevante para estabilização e administração de conflituosidades.

É importante lembrar, dentro disso, que a atribuição do valor não reside na coisa em si mesma, mas no sujeito cognoscente (ou seja, no ser humano, quem CRIA e ELABORA valores, no mundo da cultura) que, em nível político, traz a taxatividade e, a partir daí, elabora juridicamente a norma.

Com isso, oportuno lembrar que os bens jurídicos são definidos legalmente, de acordo com situações políticas! Por isso que Nilo Batista sempre afirma SER TODO CRIME POLÍTICO, na medida em que a seletividade do que irá ser objeto de tutela depende de um ato de motivação política que se plasma na norma.

Em um contexto de exame crítico do direito penal, bem como a partir da severa crítica feita pelo abolicionismo (ver Zaffaroni, Hulsman, Wacquant etc.) precisamos refletir sobres os seguintes aspectos:

  • a "listagem de bens jurídicos" trazidos para a CF/88, CPB e leis extravagantes corresponde os bens jurídicos tutelados à satisfação geral?
  • é possível realizar uma lista que satisfaça razoavelmente a todos os segmentos ou grupos e subgrupos sociais? Em outras palavras, a dimensão de valor com que cada grupo vê os bens jurídicos é a mesma em termos de adequação de conduta à norma penal?
  • existem BENS JURÍDICOS disponíveis para O USUFRUTO DE TODOS E TODAS EM SOCIEDADE?
  • todos e todas têm acesso aos bens jurídicos?
  • quem realmente define quais os bens a serem tutelados?
  • os membros da sociedade (grupos, minorias, maiorias etc.) reconhecem, de maneira igualitária, os bens jurídicos escolhidos?
  • a igualdade formal (no plano abstrato) corresponde à igualdade material em relação ao acesso e gozo dos bens?

As respostas a tais reflexões - feitas pelos abolicionistas e críticos do direito penal e do sistema penal - levam a um profundo caminho de descrença nas "missões" de igualdade que o direito penal e o sistema penal pretendem cumprir. Isso é importante...o básico para se falar em direito, justiça e proteção penal-constitucional, principalmente quando se agrega à reflexão a agenda de compromissos que o Estado Democrático de Direito assume diante do postulado de dignificação do ser humano...Ufa, que árdua tarefa nossa!

Acho particularmente interessante começar o estudo dos crimes contra a pessoa e patrimônio a partir do rol feito no art. 5o., caput, pois - para quem gosta de "dimensões de direitos" - trata-se da "primeira linhagem" de preocupações concernentes aos chamados direitos de primeira geração (o EU, expressão da individualidade).

Não gosto de hierarquizar direitos, pois isso pode dar a falsa sensação de primazia, hierarquia e importância aos direitos liberais, ou seja, à expressão máxima de uma INDIVIDUALIDADE que esqueça o grupo.

Daí apreciar bastante o trabalho dos comunitaristas que, como Michael Walzer, Charles Taylor, Michael Sandel e Alasdair Maclntyre, A. Honneth, vêem o indivíduo como um ser historicamente situado, em oposição a um caráter universalista a-histórico, que rejeita as multiplicidades culturais e as identidades sociais presentes na sociedade contemporânea.

Ou seja, ao invés de focar o primado da lei como razão (constitucionalismo liberal), opto pelo penalismo-constitucionalismo comunitário: primado da lei como vontade política de uma comunidade histórica, que olha para os grupos. É o cerne do debate no STF atualmente...

Qual a consequência disso? Ponderar analítica e criticamente o sentido do que "vida" e "patrimônio" representam, a partir da CF/88, para a diversidade presente na sociedade brasileira, principalmente considerada a partir dos grandes contrastes (divisão de renda injusta, linha de miséria, falta de acesso aos bens de consumo, impunidade de criminalidade de colarinho branco etc.).

Acho que é mais ou menos isso...

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Globalização, modernidade e crise: o neoliberalismo e a transnacionalização de códigos jurídico-repressivos

O que tem a globalização a ver com o direito penal?

Hahaha, muito mais do que pode supor nossa vã filosofia...

A globalização uma tênue e superposta fronteira de segregação entre setores econômico, político, social e jurídico na pós-modernidade, onde ressalta o paradoxo entre a tendência não-intervencionista do Estado nacional, com a perda de sua autonomia e centralização, concomitantemente à revalorização do indivíduo.

Advém o pilar da emancipação como princípio organizador de manifestações sociais, como expõe Santos em relação ao paradigma pós-moderno de agravamento da injustiça social, materializado na concentração de riqueza, bem como na exclusão social que, em larga escala, propagam-se pari passu com a globalização (1999, p. 83).

O intervencionismo do Estado-Providência é substituído por uma expressão bicéfala, ora atuante, ora ausente nas relações com os grupos formadores das comunidades, a exemplo do intervencionismo mínimo de mercado, acompanhado do aumento da repressão da criminalidade, na defraudada “guerra” pelo estabelecimento da lei e da ordem.

Restam reunidas, assim, condições propícias para que o mundo passe a experimentar uma progressiva interconexão de fronteiras culturais, econômicas e políticas, como resultado da panoramização de mercados e conseqüente aproximação entre comunidades, Estados e indivíduos.

Este fenômeno finda por modificar os contornos espaço-temporais do mundo ao longo dos últimos 20 anos de pós-modernidade, a exemplo da formação de oligopólios transnacionais e mercados regionais consolidados, assentados em uma divisão do trabalho de origem descentralizadora, propiciadora da formação de espaços de produção globalizados, resultado direto de uma tendência de internacionalização do capitalismo verificado a partir do pós-guerra (CORSI, 1997, p. 102-108).

Como conseqüência, salienta-se a coexistência de centros imanentes de conhecimento e poder, por meio do rompimento abrupto de padrões isolados ou localizados, para abranger a diluição de valores e parâmetros decorrentes da planetarização da economia, aliada à orientação política, social e jurídica que lhe dá suporte.

Pode ser inferida desta conjunção de fatores a latente crise nos paradigmas pós-modernos do Estado-nação, na medida em que a noção de soberania - reconhecida como poder político-jurídico incontrastável de supremacia interna e irrestrita independência - sofre uma necessária redução de alcance, para se ajustar às novas necessidades de coexistência de múltiplos focos injuntivos de poder (IANNI, 1997, p. 18).

Disto desponta a reflexão sobre a existência de fenômenos de verticalização e horizontalização nas relações entre os Estados, o que denota eventuais vínculos de atributividade hegemônica de um país em outro, findando por reduzir a globalização a uma mera disputa política de jogos de espaço, onde os países periféricos representam apenas satélites geopolíticos de manipulação de interesses.

Este modelo contraditório encontra nos primados éticos os limites de sua atuação, por não haver respostas aos seguintes questionamentos: existe uma lógica valorativa? Em caso afirmativo, é possível a homogeneização de estruturas – políticas, sociais e jurídicas, ante à diversidade cultural firmada e revelada pelo mesmo fenômeno? Sendo confirmada tal assertiva, quais são os novos parâmetros e os agentes responsáveis pela dicção de tais valores?

Pelo exposto até o momento, o fenômeno globalizante é o resultado de um maciço movimento assentado nas modificações proporcionadas pela irradiação e sedimentação da lógica operacional da expansão do capitalismo de mercado, erigido em escala transnacional, com o suporte oferecido pelos coetâneos movimentos culturais, políticos e jurídicos hegemônicos.

Por esta razão, antes de representar uma proposta emancipatória, na qual o mundo, reunido em torno de uma idéia partilhada de crescimento auto-sustentável, a globalização é dimensionada, no âmbito dos objetivos que o presente trabalho almeja, em uma realidade excludente, em que as promessas do capitalismo não alcançaram as propostas nas quais assentaram seu suporte ideológico e operativo.

Ao contrário de uma propalada “aldeia global”, o fenômeno globalizante exsurge como resultado da existência de pólos hegemônicos e contra-hegemônicos de poder, presentes nas distintas áreas do conhecimento humano, na qual a bivalência de percepções distintas do fenômeno convida o leitor à confrontação do tema a partir da reflexão.

Resta sobrelevar, dentro das opções dimensionadas, a localização do direito, do sistema penal, e do controle social como subsistemas inseridos nesta realidade fenomenológica, pois, contrariamente à lógica kelseniana de neutralidade do direito, este está sobremaneira permeado, no âmbito de um suporte sistêmico, pelos influxos pulsantes qual processo multifacetado.

Dallari aponta os possíveis reflexos da globalização no campo do direito, com base na coexistência de duas tendências antagônicas e complementares: “uniformização do direito no plano global e a diferenciação do direito em função das particularidades do Estado ou de ente dotado de poder que o substitua” (1999, p. 255). Acredita o autor na valorização do direito internacional público, bem como na adoção, por parte do direito interno de Estados, de normas e instituições similares ou idênticas.

A questão, contudo, é bem mais complexa do que o enfrentamento jurídico-normativo, abarcando reflexos no subsistema social que o direito, o direito penal e o sistema , penal, bem como o controle social representam.

As transformações ao longo da expansão de um capitalismo de livre mercado representam o marco de modificações por meio das quais o Estado liberal veio sendo paulatinamente convertido em instrumento operacional da consecução de objetivos concretos, compatibilizado à tônica de promoção do crescimento econômico operacional que o direito representa como domínio lingüístico, de modo que a centralização do Estado cede espaço à articulação de microestruturas normativas, segundo Bicudo em A globalização e as transformações no Direito Penal (1998):

"Diante desta realidade, a concepção do direito como um sistema fechado, hierarquizado e axiomatizado de normas de conduta, concepção proveniente do constitucionalismos, foi sendo substituída por um direito visto como conjunto de microssistemas legais aptos a captarem a crescente complexidade da realidade socioeconômica.
Enquanto no paradigma do direito positivo oriundo do Estado liberal, o sistema jurídico é caracterizado pela completude do ordenamento jurídico, no qual predomina a coerência formal e logicidade interna, isento de lacunas e antinomias ; esse sistema jurídico emergente se caracteriza pela multiplicidade de suas regras, pela variabilidade de suas fontes e pela provisoriedade de suas estruturas normativas, que são quase sempre parciais, mutáveis e contingentes.
Essa situação torna-se ainda mais complexa com o fenômeno da globalização econômica, no qual, os sistemas técnico-científicos, produtivos, financeiros e comerciais especializam-se e subdividem-se continuamente, produzindo suas próprias regras, seus próprios procedimentos e suas próprias racionalidades e concepções de justiça, dificultando, assim, o trabalho do legislador e, ainda, condicionando a aceitação das prescrições produzidas pelo Estado aos distintos sistemas. (1998, p. 99)"


Como consectário direto, Bicudo sustenta que o fenômeno da globalização econômica é precursor de um pensamento funcionalista no primado intervencionista do direito penal, antagônico a sua função outrora garantista, resultado de uma globalização hegemônica de moldes estadunidenses e japoneses, mormente no que diz respeito à orientação do direito na atribuição de concretude às metas definidas por um modelo programático de multiplicidade de regras e variabilidade de fontes (1998, p. 98). Ou seja, O NEGÓCIO É A CIFRA RENTÁVEL DO NEGÓCIO!

A soberania jurídico-positiva do Estado é, portanto, constantemente questionada, por meio de estruturas e técnicas de descentralização, desinformalização, deslegalização e desconstitucionalização que, segundo Bicudo, estão dispostas a partir das seguintes constatações:
ampliação da incompatibilidade entre o tempo da legislação processual em matéria civil e penal e o tempo do processo decisório no âmbito dos mercados transnacionalizados, ensejando o desenvolvimento de procedimentos de arbitragem;
progressiva redução do grau de coercibilidade do direito positivo;
reprivatização do direito, com a paulatina substituição da tutela governamental pela livre negociação;
enfraquecimento progressivo do direito do trabalho;
internacionalização dos Estados;
aumento no ritmo de regressão dos direitos sociais e humanos, em face da relativização da soberania dos Estados;
fortalecimento da sociedade civil em face do Estado, ante à deslegalização;
expansão hegemônica dos modelos jurídicos anglo-saxônicos, com base no discurso da eficiência, do pragmatismo e da flexibilidade, em detrimento da garantia do processo e segurança do direito (1998, p. 100-101).

O direito penal identifica-se com a política criminal, inserido como subsistema social, onde “o conteúdo das categorias do sistema dogmático deve determinar-se em função do que resulte mais adequado ao sistema social em geral ou a um subsistema social em particular, tal qual o subsistema do direito penal. Funcional, neste sentido, é tudo o que se requer para a manutenção do sistema.” (1998, p. 104). Daí a ressalva realizada pela autora, que percebe nesta conexão o esvaziamento do direito penal enquanto previsão valorativa e garantista, para representar uma opção política e reacionária de retribuição jurídico-repressiva.

O questionamento sobre os fins a que se destina o direito penal encontra na mudança teleológica de proteção de bens jurídicos para uma missão funcionalista de manutenção do sistema, de acordo com a autora:

"Inicialmente, a mudança do foco da finalidade do direito penal, de defesa dos bens jurídicos caracterizados por interesse essenciais à convivência humana , para a manutenção do ordenamento jurídico, traz em si algumas conseqüências.
O direito penal deixa de ser a ultima ratio para a resolução dos conflitos sociais, passando a ser a prima ratio. O direito penal, neste contexto, passa a ser instrumento da política criminal vigente, para a qual se faz necessária a proteção jurídico-penal para os hipossuficientes da sociedade. Assim, problemas ambientais, drogas, criminalidade organizada, economia, informática, controle bélico, feminismo, são aéreas das quais se encarregará o direito penal. A resposta penal surge como primeira, se não a possível saída para controlar esses problemas.
O direito penal funcionalizado pela política criminal apresenta uma justificativa mais fácil perante a opinião pública , mas encerra em si um perigo, qual seja, o de que são dadas tarefas ao direito penal que ele não pode cumprir, ou que cumpre a despeito de assegurar as garantias e princípios que lhe são básicos. (BICUDO, 1998, p. 104-105)
"

Em Globalização e Direito Penal Brasileiro: Acomodação ou Indiferença?, Silva aproxima diretamente a globalização do direito, entendendo o fenômeno como “um processo uniforme no qual os Estados-nação, culturas nacionais e, consequentemente, o Direito são transformados pela integração econômica.” (1998, p. 81).

Neste sentido, tende o direito a ser açambarcado pela economia, sendo, por conseqüência, convertido em “simples instrumento de afirmação dos ditames do mercado e dos interesses dos setores produtivo e financeiro” (SILVA, 1998, p. 84), despontando a predileção por padrões jurídico-positivos diferentes da tradição romano-germânica.

O direito penal atravessa um momento contraditório, pois, se de um lado a desregulamentação, descodificação e a desestatização acompanham um movimento globalizante, de outro, há um nítido intervencionismo estatal, consubstanciado na ampliação da repressão ao crime, quer seja construindo novos tipos penais ou incriminando atividades em todos os ramos sociais.

O sistema jurídico-repressivo firma-se como necessidade premente, dentro da lógica sistêmica de impulso aos postulados de eficiência, pragmatismo e operatividade, quer seja por meio da relativização dos princípios da legalidade e tipicidade, como, ainda, a redução paulatina do sistema de proteção dos direitos fundamentais do indivíduo (SILVA, 1998, p. 85).

Resulta daí, a estruturação jurídico-repressiva num corpus aberto às necessidades do livre mercado, na medida em que este deflui da lógica neoliberal marcada pelo fluxo de valores e estratégias globalizadas pelos pólos hegemônicos de poder (econômico, cultural ou político).
Sintetiza Silva alguns consectários de uma globalização hegemônica experimentados pelo direito penal brasileiro:

promulgação de excessivas leis extravagantes, com a criação de novos tipos penais;
sentenças penais embasadas em jurisprudências estanques da realidade, compartimentadas de forma fechada, preservando e reproduzindo uma atitude dogmática, estimulando a preferência pela súmula vinculante, em uma reprodução do precedente judicial estadunidense;
literatura penal representada pela edição de manuais práticos de direito penal, sem inovações substanciais, fulcrados nos ensinamentos meramente dogmáticos nos moldes do pensamento clássico da Escola Positiva;
privatização do direito penal, por meio da adoção de parâmetros e institutos processualísticos civis, com o desvio de perspectiva de utilização do princípio da oportunidade;
aumento da segurança privada;
flexibilização ou relativização de garantias no campo penal;
edição de leis mais severas e gravosas, resquícios do Movimento da Lei e da Ordem, que dramatiza a violência e incute a sensação de insegurança e impunidade na opinião pública;
reforma judicial e ensino jurídico calcados no dogmatismo acrítico e descompassado com a realidade, de modo a não propiciar a multidisciplinariedade e o humanismo (SILVA, 1998, p. 93).


Zaffaroni entende no fenômeno globalizante um processo irreversível de implementação de um poder planetário, revestido não somente de um novo eixo, mas também de uma ideologia legitimante, centrada principalmente num paradigma centro-periferia, como aponta em La globalización y las actuales orientaciones de la política criminal (2001).

Segundo o autor, podem ser sintetizadas as características desse novo poder planetário:

existência de uma revolução tecnológica, de natureza comunicacional;
redução do poder regulador econômico, favorecendo, assim, um mercado internacional;
concentração de capital, com a predominância do capital financeiro;
predileção pelo custo zero, bem como pela redução de custos, por meio do corte de pessoal e da busca por menor tributação;
competitividade do poder político dos Estados pela atração dos capitais, principalmente em países periféricos;
uso do salário, do emprego e da tributação como variáveis de ajuste, provocando desemprego e deterioração salarial;
perda da capacidade de mediação do Estado entre o capital e o trabalho;
carência de poder, por parte dos sindicatos, para o exercício de contestação
limites mais vaporosos entre o ilícito e o lícito, ante à especulação financeira e sua ética;
reconhecimento irrestrito de todos os paraísos fiscais, sem que nada seja feito para obstaculizá-los;
inversão do sistema tributário, para compensar a menor tributação do capital com a maior taxação do consumo;
conseqüente reflexo desse fenômeno de poder direcionado à amplitude de uma relação excluído-incluído. (2001, p. 142-143)


Zaffaroni aponta para o predomínio do poder econômico planetarizado, em detrimento do poder político nacional, sob a égide de uma globalização valorativa, na qual inexiste efetivamente uma sociedade global, nem tampouco organizações internacionais fortes, ou um Estado global.
Entende o autor que a transposição desta realidade para o âmbito de análise do sistema penal igualmente gera o referido desconcerto ideológico, uma vez que:

"A la carga emocional del observador como partícipe de esa realidad, se añade la del especialista y se transciende cualquier capacidad humana de tolerancia a lo incomprensible. Vemos la criminalidad de mercado a escala macroeconómica sin ninguna contención y sus réditos en refugios fiscales conocidos, consentidos y seguros . (2001, p. 144)"

Sintetiza sua crítica à compreensão do mundo-circundante enquanto um grande sistema social autopoiético, ao asseverar:

"El mundo parece sin timón: cada personaje, por poderoso que se crea o manifeste serlo, aparece con um microchip descartable en un enorme ingenio electrónico: no puede dejar de hacer lo que hace, so pena de inmediato reemplazo. Los teóricos del sistema lo celebran com el nombre de autopoiésis, en función de la cual de nada sirve hacer discursos advirtiendo sobre los riesgos de cataclismos sociales, de crisis total del sistema financeiro o de recalentamiento planetario, frente a un montón de microchips insertados en el ingenio o en oferta al mismo a un buen número de personas que sonríen frente a los espejos . (2001, .p. 145)"

Zaffaroni entende estar superada pela globalização o antigo paradigma etiológico simplista, uma vez que a complexidade causal ante ao panorama globalizante é emaranhada pela interconexão de fatos e circunstâncias.

O direito penal está, segundo o autor, prejudicado quanto à identificação causal, quer seja no âmbito de uma expressão de racionalidade kantiana ou hegeliana, como também em sede de um pensamento sistêmico, convertidos em uma lógica de custos e benefícios da conduta humana refletida:

"Cuando se confunde el deber ser con el ser, el idealismo racionalista se desvirtua al grado de irracionalismo radical, pues no hay peor irracionalismo que dar por hecho la racionalidad humana, con su conseguiente desbaratamiento de cualquier estímulo para luchar por ella, toda vez que no se lucha por alcanzar um hecho natural . (2001, p. 147-148)"

A globalização socorre-se em ideologias do passado, fomentando uma lógica estruturante de livre mercado, que acarreta anomia generalizada, propiciadora de exclusão social e violência estrutural, inviabilizando qualquer política-criminal de prevenção primária.

O direito penal, bem como as instâncias formais de controle social estão legitimadas, dentro deste contexto, a resolverem todos os problemas e casos que venham a engrossar suas fileiras, motivando aquilo que Zaffaroni entende como um “sistema cerrado e robótico” do direito penal, caracterizado por mensagens virtuais de espetáculo legiferante, que traz como resultado direto o aviltamento do sistema de garantias, sob a escusa de não funcionalidade, prisma de racionalidade elencado como parâmetro inspirador de gerações futuras, que irão reproduzir essa operatividade mecânica (2001, p. 157).

MATRIX, MINHA GENTE, MATRIX!